NUANÇAS DA MANOBRA 1

meninos & meninas,
 
para vocês, uma poesia que revela uma nuança da poética da querida e admirada cláudia roquette-pinto.
 
tal característica já foi levantada aqui, na publicação do poema “sítio” (https://prosaempoema.wordpress.com/2009/09/25/sitio/), que é a guinada surpreendente que dão alguns dos seus versos. de repente, sem que se espere, as linhas mudam a sua prosa radicalmente, e o que, antes, seguia para um determinado ponto, numa manobra inteligente, rápida, sagaz, muda de direção e segue para outro caminho. ocorre, assim, a quebra (e queda) repentina do clima antes instaurado nos versos.
 
notem abaixo: na primeira parte do poema, clima de romance, de total harmonia. perdido, de atenção e carinho, o olho de um no olho do outro; os amantes na mesma paisagem, confiantes, felizes. de súbito, a mudança brusca da paisagem: onde, antes, a harmonia, o rio calmo, agora, na segunda parte do poema, o efeito da tromba d’água, que rasga, desaba, na floresta; raízes desventradas, arrancadas, esfaceladas, e crateras onde o rio antes espalhava seu riso. tudo, repentinamente, seco, estranho e vazio. interrompido o pulso, o bater do coração, o relacionamento extinto, perdido, o fim.
 
o rumo está livre, pessoas. manobrem em direção à poesia, pisem fundo e entrem com tudo!
 
beijo grande nocês todos!
paulo sabino / paulinho.
_______________________
 
(do livro: margem de manobra. autora: cláudia roquette-pinto. editora: aeroplano)
 
sem título
 
para S.
 
Perdido:
o plano de vôo,
a planta do terreno,
o olho engatado no outro,
palavras que não foram a esmo
(as bocas diziam o mesmo
que o coração, fosforescente, no escuro).
Sem reparo,
a concha das mãos sobre as minhas,
entre os lençóis o amor
ou a anestesia, sobre o meu
seu corpo emborcado,
na mesma paisagem, confiante.
Que rasga, desaba,
pior que a floresta depois da tromba d’água,
raízes desventradas,
crateras onde antes o rio espalhava seu riso
— tudo tão estranho e vazio,
sob o olho congelado desta lua sem alma.
Perdido.
Interrompido o pulso,
perigosamente.

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