queridos,
aqui,
abaixo,
o tal do tão do “x” da questão: linhas que se indagam sobre o desejo. deste, qual a sua procedência? de que natureza?
o desejo: do que sobrevive? e, da substância que o inventa, seja ela o que for, do quanto precisa para fazer valer-se, para firmar-se (pés rijos em terreno movediço)?
há quem não deseje? tudo o que vive deseja? existe maneira de evitá-lo? como estancá-lo?
por conta e graça do desejo, removem-se montanhas? vira-se o mundo de cabeça para baixo?
com que olhos o desejo enxerga? com que ouvidos escuta? são os nossos os seus olhos? o desejo nos ouve? possui vida própria ou vida conjugada à nossa?
o “não”, uma espécie de seta em negação, o “não”, um tipo de flecha fechada em si, consegue matar o desejo? consegue aniquilá-lo? extirpá-lo do ser? ou ao contrário?: o não, esta espécie de farpa, que incomoda, que atormenta, será que incita o desejo de ainda mais desejo ao invés de acalmá-lo, de domá-lo?
são tantas as perguntas, tantas as incertezas e tantas as respostas não conhecidas, não sabidas para esta questão — para as perguntas suscitadas pelo desejo —, que não vale o esforço qualquer pesquisa a seu respeito.
daí, a matéria que compõe a poesia que segue: poesia feita de matéria leve, muito frágil, sensível, tênue, um “poema-pluma”, assim como as questões levantadas por drummond em seus versos intitulados “tristeza no céu” (https://prosaempoema.wordpress.com/2009/08/05/sobre-plumas-que-sustentam-um-mundo/):
Todas as hipóteses: a graça, a eternidade, o amor
caem, são plumas.
saibam-se não sabedores dos caminhos maquinados pelo desejo e, vida afora, desejem!
um ótimo dia para todos nós é o que desejo neste momento.
beijo bom,
o preto,
paulo sabino / paulinho.
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(do livro: Rua do mundo. autor: Eucanaã Ferraz. Editora: Companhia das Letras)
A questão
Como decidir do desejo?
Algum padrão diz do que
e de quanto vive?
Ele vive do que deseja?
É uma necessidade?
Subsiste no fundo do tempo?
Faz-se num minuto? Morre
no outro? Perdura uma existência inteira?
O desejo nos ouve?
É cego? É doido? O desejo vê
mais que tudo? São os nossos
os seus olhos? Se os fecharmos,
ele finda? Quem pôs o desejo em nós?
Onde está posto? E onde não?
Penetra o sonho, o trabalho, infiltra
nos livros, no óbvio, nos óculos,
na cervical, na segunda-feira e os versos
não sabem outro tema.
Há quem não deseje?
Tudo o que vive deseja?
Faça-se o exercício: não desejar,
por um mês, uma semana,
um dia. O desejo fabrica-se
de nenhum aval? Ele não teme?
Não receia o sal à face da razão?
Não teme a dor, decerto, que dela
parece, por vezes, primo-irmão.
E perguntamos, perplexos. O desejo
é uma forma oblíqua de alegria? Brinca
conosco? Mas, brincarmos com ele,
ai de nós, é de seus truques
o mais fatal. Morremos de desejo?
Com ele removemos pedras?
Por ele removemos montanhas?
Pode o desejo mover o não?
(O não: esta seta o mata?
Ou esta farpa fomenta o que nele nos ultrapassa
e que, sem nome nem fim, não desistirá
senão quando tudo morto em nós?)
Química tão secreta,
não vale a pena qualquer pesquisa,
uma pluma, este poema.
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