DAR-SE, DE PRESENTE, O PRESENTE

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nihil: do latim, pronome indefinido neutro que significa “nada”, “coisa nenhuma”.

 nada (nenhum deus, ou deuses) sustenta, no nada (no silêncio escuro que é o universo), esta terra onde vivemos.
 
nada (nenhum deus, ou deuses) sustenta este ser que sou eu.
 
nada (nenhum deus, ou deuses) sustenta a beleza que o dia descerra.
 
nada (nenhum deus, ou deuses) sustenta a beleza que a noite acendeu.
 
nada (nenhum deus, ou deuses) sustenta esse sol que ilumina enquanto erra, nada sustenta esse sol enquanto vagueia (enquanto ilumina sem o propósito de iluminar), pelas estradas do breu.
 
não acredito em deus porque nunca o vi. se ele quisesse que eu acreditasse nele, sem dúvida viria falar comigo, dizendo-me: “aqui estou!” 
 
há metafísica bastante em não pensar em nada. a experiência humana, sem deus ou deuses, é já uma experiência transcendental pelo tanto de achados & riquezas que se nos apresentam todos os dias, vidadentro.
 
viver a vida que se apresenta ao alcance das nossas parcas mãos, viver a vida que se apresenta diante dos olhos, materializada: viver a vida: 
 
por isso, por que não me deitar sobre o gramado, se o consente o tempo (se há tempo para tanto), e há um cheiro de flores & verde & um céu azul por firmamento & a brisa, displicentemente, acaricia-me os cabelos? e por que não, por um momento, nem me lembrar que há sofrimento no mundo e, ouvindo os pássaros ao vento, de repente, dar a mim mesmo este presente? por que não dar a mim mesmo, já que me permite o tempo, o momento de um instante feliz & sereno? por que não dar a mim mesmo, já que me permite o tempo, este presente, este mimo, este regalo? 
 
permitir-se presentes no presente: caminhos para o melhor viver. 
 
a vida é uma só. por isso, é melhor que saibamos aproveitá-la. não sou mais tolo (como quando mais jovem, a reclamar de tudo), não mais me queixo (como quando mais jovem, a queixar-me de tudo):
 
enganassem-me mais, desenganassem-me mais; mais rápidas, mais vorazes & arrebatadoras; mais volúveis, mais voláteis; mais aparecessem para mim & desaparecessem; mais velassem, mais desvelassem, mais revelassem & mais tornassem a velar mais (isto é: mais re–velassem, mais velassem novamente):
 
eu viveria tantas mortes, morreria tantas vidas, e jamais me queixaria, jamais!
 
apesar dos pesares, sou um apaixonado pela vida — não sou mais tolo, não mais me queixo. viveria todas as vidas que me fossem possíveis, apesar dos pesares, apesar dos desenganos.
 
todavia, a via-vida é uma só. 
 
paulo sabino: apenas nesta existência aqui, não mais.
 
vida: livro que não pode ser relido. 
 
vida: uma única chance, não mais. 
 
portanto, como única chance, é melhor que valha.
 
vida: valeu! não a repetirei jamais!
 
beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Porventura. autor: Antonio Cicero. editora: Record.)
 
 
 
NIHIL
 
 
nada sustenta no nada esta terra
nada este ser que sou eu
nada a beleza que o dia descerra
nada a que a noite acendeu
nada esse sol que ilumina enquanto erra
pelas estradas do breu
nada o poema que breve se encerra
e que do nada nasceu
 
 
 
PRESENTE
 
Para Eucanaã Ferraz
 
 
Por que não me deitar sobre este
gramado, se o consente o tempo,
e há um cheiro de flores e verde
e um céu azul por firmamento
e a brisa displicentemente
acaricia-me os cabelos?
E por que não, por um momento,
nem me lembrar que há sofrimento
de um lado e de outro e atrás e à frente
e, ouvindo os pássaros ao vento
sem mais nem menos, de repente,
antes que a idade breve leve
cabelos sonhos devaneios,
dar a mim mesmo este presente?
 
 
 
APARÊNCIAS
 
 
Não sou mais tolo não mais me queixo:
enganassem-me mais desenganassem-me mais
mais rápidas mais vorazes e arrebatadoras
mais volúveis mais voláteis
mais aparecessem para mim e desaparecessem
mais velassem mais desvelassem mais revelassem mais re-
velassem
mais
 
eu viveria tantas mortes
morreria tantas vidas
jamais me queixaria
jamais.
 
 
 
VALEU
 
 
Vida, valeu.
Não te repetirei jamais.

2 Respostas

  1. Muito bom, querido! Saudades, só do mundo que ainda não vivemos. Para o qual partimos com a bagagem acumulada na existência que, ‘pelo que já foi, valeu!’ Grande beijo!

    • QueridÍSSIMO,

      Saudades suas também!

      Quando estiver na área, avise! Os nossos encontros são sempre muito divertidos!

      Beijo GIGANTE!

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