PROPOSTA

Balões no céu

 

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a proposta:

esquecer a cicuta, esquecer a culpa.

esquecer o gatilho, esquecer o que for preciso (a culpa que atormenta).

esquecer o salto da ponte — para que ir tão longe?

(ir para lugar que, de tão longe, não se pode mais regressar.)

esquecer o gás cianídrico, o gás que sufoca o dia.

(o dia está tão lindo!)

esquecer os ansiolíticos, esquecer os comprimidos que podem levar a um sono eterno, esquecer o que já foi perdido (afinal, a vida é feita de perdas & ganhos, a vida é, também, perder).

esquecer a navalha a faca a adaga a gilete o canivete.

esquecer o edifício mais alto — os nossos vôos devem ser mais altos que o vôo do edifício alto, vôos libertos na imaginação, nos sonhos.

esquecer o trem que passa rápido — as nossas viagens não devem terminar nos trilhos; estes são o início de tudo.

esquecer o mar, o imenso abismo que é o mar — os nossos mergulhos devem ser os mais profundos nas águas da existência.

esquecer o harakiri (ritual suicida, praticado por guerreiros samurais, como forma de expiar & pedir desculpas pelos erros cometidos) — ainda há tanto o que tecer por aqui!, ainda há tantas tramas, histórias tantas, a serem urdidas no pano da vida!

esquecer a gasolina o querosene o álcool — o nosso combustível deve ser o sentimento de mudanças, sentimento que lance fogo àquilo que traz culpa & a (maléfica) sensação de fracasso.

esquecer a pedra no pescoço, as chantagens, o fim do poço.

esquecer o trinta-e-oito & sua bala nada doce, nada saborosa, bala que, posta na boca, sem dissolver em saliva, dispara um sabor de sangue coagulado. (e a porta que abriu jamais se fecha…)

esquecer a forca, a corda no pescoço, esquecer o fogo (que chamusca & machuca).

pensar mais um pouco, um pouco mais…

para, então, com razão, perceber quão distinta (& vibrante & inédita & única & múltipla & sem chances de repetição) é a vida.

a natureza — coloque-a em sua cabeça.

ponha-me em seu coração.

que satisfação seria para mim, algo sem fim!

depois?

bem, depois de esquecer a cicuta, a culpa, o gás cianídrico, os ansiolíticos, a navalha, a faca, a adaga, a gilete, o canivete, a gasolina, o querosene, o álcool, as chantagens, o trinta-e-oito, o fogo, a corda no pescoço, não esquecer que a vida é mais que problemas, não esquecer que a vida é mais que perdas, não esquecer que a vida é mais que fracassos, não esquecer que a vida é também o bicho a flor a criança, e, sobretudo: não esquecer do filme que estreou sábado, para não chegar atrasado!

a vida são quedas. assim sendo:

reconhecer a queda & não desanimar. levantar, sacudir a poeira & dar a volta por cima.

(resistir é preciso se se pensa em tornar mais solidário este nosso mundo cão.)

beijo todos!
paulo sabino.
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(do blog: QUEFAÇOCOMOQUENÃOFAÇO, de: Adriano Nunes. autor do poema: Adriano Nunes.)

 

 

PROPOSTA  –  para Pedro Nava

 

Esqueça a cicuta, a culpa
Esqueça o barbante, as coisas de antes
Esqueça o gatilho, o que for preciso
Esqueça o salto da ponte, pra que ir tão longe?
Esqueça o gás cianídrico, o dia está tão lindo!
Esqueça os mesmos ansiolíticos, o que já foi perdido
Esqueça os tantos comprimidos, os perigos do íntimo
Esqueça a estricnina, a malícia da esquina
Esqueça os barbitúricos, os muros do mundo
Esqueça a navalha, a faca, a adaga, a gilete, o canivete
Esqueça o cloreto de potássio
Esqueça o edifício mais alto
Esqueça o trem que passa rápido
Esqueça o mar, o imenso abismo que é o mar
Esqueça o harakiri, ainda há tanto o que tecer por aqui
Esqueça a gasolina, o querosene, o álcool
Esqueça o lance súbito sobre o movimentado asfalto
Esqueça os cumarínicos
Esqueça as descargas elétricas, para que pressa?
Esqueça a pedra no pescoço, as chantagens, o fim do poço
Esqueça o trinta-e-oito
Esqueça a forca, esqueça o fogo
Pense mais um pouco,
Um pouco mais…
Então com razão, perceba
Quão distinta é a vida, a natureza,
Coloque-a em sua cabeça,
Ponha-me em seu coração…
— Que satisfação
Seria para mim,
Algo sem fim! —
Depois? Nós dois e o cosmo
Mergulhados no mais intenso propósito.
Não se esqueça, Não se esqueça
Do filme que estreou sábado,
Para não chegarmos atrasados

2 Respostas

  1. Querido Paulo Sabino, poeta amigo,

    tua leitura, sempre atenta, atinge-me o âmago. O âmago de tudo aquilo que quer dizer o poema, e, através de ti, diz mais e além. Muito grato!

    Adriano Nunes

  2. Meu querido & amado & bem-vindo & bem-lindo poeta das Alagoas,

    Sempre eu a agradecer todo o seu talento & sua usina de produção poderosa & luxuosa!

    É um grande prazer & um grande orgulho contar com os seus versos, com seu requintado trabalho poético. Obaaa!

    Beijo grande!

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