(O ser do rio: nunca nos banhamos no mesmo rio…)
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eis, aqui, o canto maneiro, aqui, um modo de cantar bacana:
eu canto à maneira índia. eu canto à maneira negra. eu canto à maneira grega. eu canto à maneira gregoriana.
eis, aqui, o canto maneiro: todas as maneiras do cantar cabem no meu canto. todas as vozes a minha garganta abriga. porque belezas são complementares, não excludentes. e porque o que é belo ganha mais, fica melhor, porque existe o diferente. o mundo nos estampa isso a toda hora: a quantidade de formas & cores & elementos & texturas da natureza mostra que a beleza — num sentido mais amplo — está na diversidade.
eu canto de todas as maneiras (índia negra grega gregoriana): eis o canto maneiro: todas as vozes a minha voz abriga.
eu canto à maneira de heráclito: o fogo, o transe, a transmigração.
eu canto à maneira de heráclito: o ser do rio — nunca nos banhamos no mesmo rio.
heráclito: filósofo pré-socrático; parte do princípio de que tudo está em movimento, nada pode permanecer estático — tudo se move, tudo se movimenta, exceto o próprio movimento (heráclito é considerado por muitos o pai da “dialética”). heráclito cria no princípio do devir incessante, acreditava no princípio da transformação constante das coisas. aqui, um seu fragmento célebre: “não é possível entrar duas vezes no mesmo rio, nem tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado; graças à velocidade do movimento, tudo se dispersa e se recompõe novamente, tudo vem e vai”. o filósofo pré-socrático atribuía a um elemento a responsabilidade da existência de todas as coisas mundanas em mudança: o fogo.
fogo: elemento que ilumina, que tira as coisas da escuridão, elemento que aquece.
somos como o rio: nunca as mesmas águas, sempre outras a passar. nunca somos os mesmos, vamos nos modificando com o passar do tempo (nascimento, infância, pré-adolescência, adolescência, as idades adultas & velhice), sempre metamorfoses ambulantes, sempre na transmigração, na alteração de domicílio — um dia, descobrimos que a “casa” que nos abriga não nos serve mais & precisamos abandoná-la por outra que nos dê a devida guarida, por outra que nos dê a devida acolhida.
o ser do rio: nunca nos banhamos no mesmo rio (nunca as mesmas águas, sempre outras a passar, o rio está em contínuo fluir)…
eu canto à maneira eletrônica, eu canto ao modo moderno de cantar, eu canto para o que é criação da inteligência humana, eu canto para a ciência, eu canto para os avanços tecnológicos & científicos que podem melhorar a qualidade das nossas vidas.
eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira índia, negra, grega, gregoriana: cantar a todas as maneiras de cantar.
eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira de heráclito: o fogo, o transe, a transmigração, o ser do rio (nunca nos banhamos no mesmo rio…).
eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira eletrônica, utilizar-se de tudo que no mundo está, seja velho, seja novo, seja o que for, a fim de cantar, e cantar bem, cantar com a voz emocionada, para que tudo o que é cantado exista em sintonia com o bem-estar do mundo, para que tudo o que é cantado esteja afinado com o bom da vida. tudo dentro do tom.
o canto maneiro: o canto que abriga, que acolhe, que oferece morada.
beijo todos!
paulo sabino.
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(do encarte do cd: Mulheres de Péricles. artista: Vários. autor dos versos. Péricles Cavalcanti. selo: Joia Moderna.)
CANTO MANEIRO
Eu canto à maneira índia
Negra, grega, gregoriana
Eu canto à maneira de Heráclito
O fogo, o transe, a transmigração
O ser do rio
Nunca nos banhamos no mesmo rio
Eu canto à maneira eletrônica
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(do site: Youtube. áudio extraído do álbum: Mulheres de Péricles. artista: Vários. canção: Canto maneiro. autor da canção: Péricles Cavalcanti. intérprete: Juliana Perdigão. selo: Joia Moderna.)
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