(A cidade do Rio de Janeiro, a mais cara cidade do país & uma das mais caras cidades do mundo, em dias de chuva de verão: a pergunta que não quer calar: quem é que vai pagar por isso?…)
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às quatro da tarde, na floresta da tijuca, floresta cravada nas montanhas que cortam o rio de janeiro, a terra se entrega para a chuva & a terra segrega, separa, aparta, humores túmidos, a terra segrega, separa, aparta, às plantas, o alimento de que precisam para estarem firmes, fortes, a terra segrega, separa, aparta, para as plantas os humores túmidos, os líqüidos encorpados, com que se alimentam, a fim de manterem-se firmes & fortes em sua jornada estática.
a chuva a penetra, penetra a terra, segregando os seus humores túmidos, segregando os seus líqüidos encorpados de alimentos que servem às plantas.
as samambaias & os jatobás se regozijam com o acalanto das águas.
as flores-da-paixão (que são as flores do maracujá), lindíssimas, se abrem de contentamento.
a chuva na floresta: uma bênção do céu.
mas, não longe dali, da floresta, mais abaixo, na cidade que é cortada pelas montanhas, as calhas os rufos os bueiros & as sarjetas, indiferentes a humores & encantos, as calhas os rufos os bueiros & as sarjetas, impassíveis aos líqüidos encorpados da terra & aos encantos florais, se preparam para o trabalho sujo.
o trabalho sujo: o lixo espalhado pelas ruas & calçadas da cidade mais a rede de esgotos & de escoamento da água pluvial deficientes, que já não atendem às demandas urbanas dos dias de hoje, resultam nas célebres enchentes & alagamentos que assolam a cidade nos dias de verão.
entra ano, sai ano, entram prefeito & governador, saem prefeito & governador, e a cidade continua com os mesmíssimos problemas de enchentes & alagamentos provocados pelo calor excessivo dos dias de verão.
à tarde, no fim do dia, depois da cidade “fritar” num sol de mais de 40 graus, um toró desaba & transforma a vida do residente num imenso transtorno. pessoas morrem levadas pela força das correntezas dos rios-ruas, pessoas morrem eletrocutadas, pessoas perdem suas casas em desabamentos, pessoas presas nos engarrafamentos.
a cidade, em termos de serviços, não presta em muitos vários aspectos. e a cidade, mesmo não prestando em termos de serviços sob vários aspectos, é a mais cara do país & das mais caras do mundo. morar, comer, beber, ir a um espetáculo, pegar um cinema, tudo no rio de janeiro, hoje em dia, custa “os olhos da cara”. cidade que será sede de copa do mundo, de olimpíadas, cidade que, por ser a capital do estado, recebe (recebia) já os royalties do petróleo (com a descoberta & exploração do petróleo na camada pré-sal), cidade que vem recebendo cada vez mais turistas, em suma: uma cidade com capital financeiro, com investimentos, e, no entanto: uma cidade que não cuida dos seus calçamentos, que não cuida da qualidade das suas ruas, que não cuida da sua rede de esgotos, que não cuida do seu sistema de escoamento da água pluvial, que não dá a mínima atenção para os desiquilíbrios ambientais causados na região, uma cidade com tanto investimento financeiro & que não investe nos serviços oferecidos. a negligência parte dos gestores oficiais da cidade.
pode-se perguntar: mas a população da cidade não é deseducada, a população da cidade não joga lixo nas ruas, nas praias? sim, a população da cidade é deseducada, joga lixo nas ruas, nas praias, contribui com as enchentes & os alagamentos (afinal, o entupimento de bueiros acontece pelo excesso de lixo jogado nas ruas pelos transeuntes). mas isso, em parte, é responsabilidade dos gestores oficiais da cidade. não existe nenhuma política SÉRIA para a manutenção da cidade limpa ATRAVÉS DE um trabalho DEDICADO à educação da população residente. no estado do rio de janeiro, há alguns anos atrás, a cidade de cabo frio foi eleita a quinta cidade mais limpa do brasil. conseguiu o título porque os gestores oficiais do município apostaram numa política SÉRIA de educação da população quanto a lixo nas ruas. é impressionante: seja no centro, seja em bairro pobre, seja em bairro nobre, nas praias, em cabo frio não se vê detrito nas vias públicas, na orla marítima.
sabe-se que as condições climáticas do planeta estão mudando muito rapidamente. a cada ano, a terra aumenta um tanto a sua temperatura, e esse aumento da temperatura — gerando, conseqüentemente, mais calor — contribui, entre outras coisas, para chuvas de verão (aqui no rio de janeiro) cada vez mais intensas, chuvas de verão (aqui no rio de janeiro) cada vez mais volumosas.
(uma cidade que não cuida dos seus calçamentos, que não cuida da qualidade das suas ruas, que não cuida da sua rede de esgotos, que não cuida do seu sistema de escoamento da água pluvial, que não dá a mínima atenção para os desiquilíbrios ambientais causados na região, e que é, em termos de serviços, a mais cara do país…)
uma cidade com tanto investimento financeiro & que não investe nos serviços oferecidos…
cuidar da cidade do rio de janeiro, para que não mais ocorram enchentes & alagamentos, para que as calhas os rufos os bueiros & as sarjetas não mais tenham que se preparar para o trabalho sujo, é deixá-la em harmonia com os humores & encantos que a chuva leva à terra ao penetrá-la & tê-la sua.
beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Enquanto velo teu sono. autor: Adalberto Müller. editora: 7Letras.)
CHUVA DE VERÃO
Às quatro da tarde
a terra se entrega para a chuva
e segrega humores túmidos.
A chuva a penetra.
As samambaias e os jatobás
se regozijam
com o acalanto das gotas.
As flores-da-paixão se abrem
de contentamento.
Mas
não longe dali
as calhas os rufos os bueiros e as sarjetas
indiferentes a humores e encantos
se preparam para o trabalho sujo.