DESABAFO: ACORDA, BRASIL!
6 de dezembro de 2012

Décio Pignatari

(O poeta Décio Pignatari.)
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Escreveu (muitíssimo bem) o poeta Régis Bonvicino:

“A morte do poeta paulistano Décio Pignatari, ocorrida esta semana em São Paulo, aos 85 anos, produziu uma série de manifestações na imprensa, como seria de se esperar. O surpreendente foi o tom nostálgico que marcou a maioria delas, ao mesmo tempo em que, contraditoriamente, também se acentuava certa modernidade essencial de Pignatari. Alguns afirmaram que seu ‘espírito inovador’ faz falta à poesia atual, outros, que Pignatari jamais foi reconhecido como deveria, não tendo, por exemplo, recebido prêmios literários.”
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Um DESABAFO de PAULO SABINO:

sinceramente, às vezes eu não entendo o Brasil. Quer dizer que, agora, depois de falecido, todas as loas & todos os reconhecimentos a Décio Pignatari? De um dia pra outro, todos os salves à obra do poeta?

Vem cá: e quando vivo? e quando entre nós, por que a falta de tantas homenagens & matérias de jornal?

Sabe o que acho? CARETICE, MEDO, INVEJA, por parte de quem compõe a elite literária, CARETICE, MEDO, INVEJA, dos que encabeçam os prêmios & críticas literários. Puxa vida, um poeta de tão altas capacidades… capacidades, aliás, reconhecidas por todos que, de algum modo, mexem com literatura (vide a comoção diante da morte do poeta).

E me pergunto: por que fingir menosprezo, por que fingir certa falta de importância, a uma obra tão cheia de requintes, como é a obra do Décio, enquanto Décio estava vivo, entre nós? Nem 1 prêmio literário com obra tão vasta & festejada? COISA BESTA, ABSURDO PEQUENO, ATITUDE MESQUINHA.

Agora que o bardo se foi, agora que não tem mais jeito (infelizmente o processo de ressurreição morreu com o Cristo na cruz), como vai ser? Um “pipocar”, uma enxurrada, de prêmios ao poeta morto?

Agora, poeta sete palmos abaixo da terra, todos os reconhecimentos à sua fantástica obra…

PAÍS DE MERDA!, que não sabe dar valor ao que tem, PAÍS DE MERDA!, que precisa de aval estrangeiro pra reconhecer o que é valoroso no seu território. TRISTE TRISTE TRISTE, HORROR HORROR HORROR…

Na boa: às vezes penso que o BRASIL, melhor: que alguns BRASILEIROS — falando bem diretamente ao meio literário — NÃO MERECEM alguns filhos deste solo, filhos da grandeza de DÉCIO PIGNATARI.

O que acontece agora com o Décio (MORTO) é recorrente no Brasil. E os senhores não fazem idéia da VERGONHA que sinto…

Agora podem me perguntar: se acho importante que finalmente Décio Pignatari seja reconhecido? que receba prêmios & loas? que seu nome, finalmente, ganhe o país?

Acho, acho super importante, e desejo!, e quero!, que isso aconteça.

Mas, porra!, é preciso que o homem morra sem o devido reconhecimento dos próprios pares (digo: jornalistas, críticos & poetas)?

Caralho!, ele fez pela língua portuguesa, Décio foi um poeta BRASILEIRO! Que medo é esse (o de admitir o grande valor & a grande contribuição literária)? que “protecionismo” babaca é esse?

Isso me REVOLTA! Porque sei que, no caso do Décio, assim como em muitos outros casos, tal fingida desconsideração pela sua obra ocorreu por conta de MEDINHOS & INVEJA de parte da classe literária.

A elite intelectual brasileira precisa CRESCER, precisa AMADURECER.

Jornalistas, críticos literários, poetas: UNI-VOS!

O que importa é a BOA poesia. Belezas nasceram para ser COMPLEMENTARES & não EXCLUDENTES!

 A existência é um grande barato pela variedade de belezas que apresenta: variedade de bichos, de plantas, de mares, de rios, de rochas, de cores, de sons, de cheiros, de pessoas. 
 
Não seria diferente na arte.
 
Pensem a respeito.
 
ACORDA, BRASIL!

PRESÍDIO
15 de maio de 2012

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a inscrição à porta da entrada:
 
“lar, doce lar”.
 
“doce lar”: pois o lar é lugar de abrigo, de refúgio, de acolhimento.
 
tende-se a buscar paz, estabilidade emocional, no aconchego do lar.
 
presídio: lar de muitos, lugar onde muitos são recolhidos para cumprimento de pena, encerrados em cela, atrás de grades.
 
em presídio não cabe a inscrição à porta.
 
ou sim, em presídio cabe a inscrição, mas se reconfigurada, como faz magistralmente o poema concreto que segue aos senhores, de um jovem & talentoso poeta.
 
beijo todos!
paulo sabino.
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(autor: Renato Silva.)
 
 
 
PRESÍDIO
 

VIA DE MÃO DUPLA: O LEITOR & O POEMA
2 de setembro de 2011

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Um leitor médio lê um poema. Ao findar a leitura dos versos, na mente do leitor, idéias soltas, versos, a princípio, desconexos. O leitor médio, angustiado, embaralhado nos seus pensamentos, sentencia: “não entendi as linhas, este poema é ruim, não presta”. 
 
João Cabral de Mello Neto dizia que poesia precisa de conhecimento de causa.
 
A poesia trabalha com linguagem, em sua máxima potência.
 
Ora, se o instrumento de trabalho do poeta é a linguagem, um bom poeta precisa, se deseja um trabalho consistente & consciente, debruçar-se no estudo da linguagem, das suas possibilidades, da sua construção, das suas causas & dos seus efeitos. Isso demanda tempo, demanda muita elocubração. Nenhum grande poeta escapa. Basta ler as cartas trocadas entre João Cabral de Mello Neto, Carlos Drummond de Andrade & Manuel Bandeira, reunidas numa obra de Flora Süssekind, sobre a importância de instrumentalizar-se. Isso acaba por trazer um rigor & uma exigência acima da média, acima do uso comum da linguagem. 

E o que dizer da poesia concreta? De Augusto & Haroldo de Campos, de Décio Pignatari?

 Então se o leitor médio não “alcança” as obras poéticas concretas dos poetas aqui citados, se o leitor médio não as “penetra”, significa dizer que as obras desses poetas são “ruins”, que as obras desses poetas “não prestam”? 
 
Se o leitor médio não “alcança” um poema do Drummond, ou do João Cabral, ou do Caetano, ou do Waly Salomão, ou do Augusto de Campos, ou do Décio Pignatari, ou do Nelson Ascher, ou do Marcelo Diniz, ou do Francisco Bosco, ou da Claudia Roquette-Pinto, ou do Adriano Nunes, o poema deixa de ser bom?
 
E por que não um “esforcinho” do leitor médio em instrumentalizar-se para alcançar a obra? Será que a questão reside no poema ou em quem o lê?

O leitor deve tomar cuidado. Eu, por exemplo, se não “alcanço”, se não “penetro”, um poema, passo um bom tempo debruçado sobre ele, e muitas vezes, muitas & muitas & muitas vezes, as belezas & a sagacidade dos versos só se desnudam, aos meus olhos, depois de muitos exercícios & estudos & apreensões, dias afora, noites adentro.

 Senão, como assim? Quer trabalhar poesia, isto é: ler poesia, e não quer ter trabalho?
 
Não há como. Ler poesia é trabalhoso.
 
Afinal, nem todo mundo é gênio; na verdade, a imensa maioria não é. Não somos gênios nem pessoas dotadas de capacidades especiais, e justamente por isso, como leitores, devemos fazer a nossa parte.
 
Se recomendo a leitura de Rilke, João Cabral, Augusto de Campos, Drummond, Pessoa, caro leitor? Recomendo sempre, considero salutar, suponho de grande relevância. Leia, caro leitor, leia. Mas leia sabendo que não é fácil e que, muitas vezes, precisamos de instrumentos — outros livros, artigos de especialistas, outros autores — para “alcançar”, para “penetrar”, determinadas obras.
 
A captação, a apreensão, de algumas obras nos são mais imediatas; de outras, não. E eu não vejo problema que assim o seja.
 
Não absorvo poesia pelos poros. Desde sempre, desde que leio poesia, e isso tem bastante tempo, é muita humildade para reconhecer que não sou gênio de forma alguma e que preciso estudar MUITO, perder noites & mais noites para “alcançar” determinados textos poéticos.
 
Dedicação extrema: eis o caminho para o bom entendimento de leituras/poemas mais densos, mais árduos.
 
Se sabemos que a poesia trabalha a linguagem na sua máxima potência, e que isso demanda um trabalho árduo do poeta para com a linguagem, nada mais natural que a apreensão do leitor se dê com o trabalho também árduo da leitura. Assim como o bom poeta, o bom leitor deve estudar a linguagem & a poesia.
 
É uma via de mão dupla: o poeta & o leitor precisam de conhecimento rico para ambos trabalharem, em suas esferas, o poema.
 
Um bom poema precisa de um bom leitor. É uma via de mão dupla.
 
Beijo todos!
Paulo Sabino.
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(autor do poema: Adriano Nunes. autor da nota: Adriano Nunes**.)
 
 
 BOCAGE AO FIM 
 
-ALMA
 
-ove -aro -ermo
-enso -aio -ece
-ares -eias -eio
 
-iso -inha -aças
-ença -ensa -ando
-assos -itos -aços
 
-usta -ana -orte
-ava -anos -oube
-ados -ero -osos

-ira -ano -undo
-ama -ento -ulta
-ina -ores -uto

-iva -oza -eça
-ia -iste -ecem
-enas -onho -echa

-eixa -agem -enta
-ajem -eras -ende
-adas -inos -eres

-anto -eja -oso
-umes -ade -osas
-ena -una -ora

-eia -ada -ido
-ela -eno -iro
-ino -uro -igo

-elo -eito -ossas
-ite -oma -oiro
-oiros ante -osto

-alam -evos -ua
-oras -erna -ume
-ofre –ente -ude

-ARTE

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**Quando Bocage encontrava-se doente, perto da morte, ele escreveu muitos sonetos. Recentemente, estudei toda a sua obra e verifiquei que em seus últimos sonetos as rimas finais eram as que lhes apresento aqui em um poema que fiz. Espero que meu poema (deu um trabalho imenso!) traga-lhes luz! Coincidentemente, as terminações -ARTE e -ALMA eram rimas em finais de versos!

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(comentário de Paulo Sabino após a leitura do poema Bocage ao fim, de Adriano Nunes
 
Que LINDO! As possibilidades que as terminações nos dão são um grande barato! Fiquei HORAS (rs) olhando, lendo, vendo como formar as palavras, as possibilidades, enfim, VIAJEI (rs rs)!

A VALSA CONCRETA
20 de agosto de 2009

adriano nunes, querido e talentoso poeta das alagoas,

recebi o “valsa para paulinho” com muita alegria e um certo assombro (rs). assombro por conta das belezas, das maravilhas descobertas no poema com uma leitura das linhas mais rigorosa.

na minha escrivaninha, destrinchei-o estrofe por estrofe, verso a verso fui escarafunchando seus espelhos d’água, esgaravatando as funduras das lagoas empoçadas em cada des-construção de palavra, para a ampliação de sentidos, para a amplificação dos significados possíveis. ei-las, algumas verificações, aqui:

este preto, pauta da mente, isto é, este preto como roteiro da mente, a linha que segue, vertical, ao raciocínio. este preto, prata, isto é, metal que brilha, este preto, proto, isto é, pão, alimento para quem quiser alimentar-se (“a poesia é para comer” – natália correia); a maneira de tê-lo, o preto/, perto: tela de computador. este preto, pele, pena, pé, tala (para, quando preciso, a ajuda na cura do pé – rs), pétala,  lendo-me em si, lendo-me em silêncio, lendo-me através do que escrevo (ou escondo – rs?), sentindo-me em síntese de sim, dizendo-me lenha, linho, pau, pedra, e perguntando-se: qual o foco? qual a forma? qual a fórmula?:

“vôo verve  envolvendo-o ?”  será (rs)?

para, enfim, o fim: depois do roteiro, depois de guiar-se pela linha preta (rs) que rasga de ponta a ponta o seu papel, o re-pouso; pouco a pouco, pausadamente, o pausar da mente, com pound, ali, no encalço: afinal, eis este preto como estímulo do que impulsiona, em você, o trabalho da sua sensibilidade.

absolutamente genial, adriano! nem sei como agradecer, nem sei como clarificar a minha alegria por receber estas linhas, tão lindas, que nem consigo afirmar se mereço…

muitíssimo obrigado por esta valsa, valsa concreta, por esta valsa avulsa, a valsa avulsa de além, ventada das alagoas e chegada à baía de guanabara.

beijo grande em você, poeta!

outro enorme em todos!

paulinho / paulo sabino.

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VALSA PARA PAULINHO (autor: adriano nunes)

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(poema extraído do blog QUEFAÇOCOMOQUENÃOFAÇO http://astripasdoverso.blogspot.com/, de adriano nunes)