A ESTANTE DO POETA (5ª EDIÇÃO): SALGADO MARANHÃO — ESPAÇO AFLUENTES
14 de setembro de 2019

(Convite para a próxima edição, nesta terça-feira, dia 17 de setembro)
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A ESTANTE DO POETA

 

A ideia do projeto é a apresentação dos poemas lidos pelo convidado — porque todo poeta, antes, é um grande leitor de poesia — e que inspiraram/ influenciaram a criação dos poemas que formam a sua obra. Apresentar, ao público, um pouco da estante do poeta: o que o nosso convidado lê e o que o inspira a produzir poesia. Levar, ao espectador, os poemas dos autores que conversam com os poemas do convidado. Fazer uma ponte entre os poemas do nosso convidado e os poemas dos autores que o inspiraram, a fim de mostrar a gênese da sua criação literária.
 
A dinâmica da apresentação: 1ª parte – o poeta conta como a poesia entrou na sua vida, como se deu o seu primeiro contato, quais autores da sua predileção naquele momento e quando se descobriu poeta, quando começou a escrever poemas (caso o poeta queira, apresentar o primeiro poema que escreveu e que o fez acreditar ser um “poeta”); 2ª parte – apresentação ao público dos poemas escritos a partir dos poemas de outros autores (quais poemas o poeta escreveu inspirado na poesia de outros poetas – apresentar, portanto, os seus poemas e os poemas que serviram de inspiração).
 
A Estante do Poeta terá a grande alegria de receber o jornalista, compositor e consultor cultural Salgado Maranhão no dia 17 de setembro, terça-feira, às 18h30, no Espaço Afluentes (Avenida Rio Branco, nº 181, 19º andar, sala 1905 – o endereço, número 181 da Rio Branco, fica exatamente em frente à estação de metrô Carioca). O evento tem uma hora de duração, podendo chegar a uma hora e meia, portanto, começa às 18h30 e termina às 19h30, no máximo às 20h.
 
Aguardamos vocês!

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A seguir, as informações a respeito das edições anteriores:

 

O projeto estreou com a presença e irreverência do acadêmico, tradutor e dramaturgo Geraldo Carneiro, que nos brindou com histórias hilárias da sua vida literária.

 

A 2ª edição recebeu o acadêmico, letrista e filósofo Antonio Cicero, que, além de partilhar a sua história com a literatura, nos brindou com o seu método de escrever letras de música.

(Na foto, Claudia Roquette-Pinto, que idealizou e administra com a sua irmã, Mariana Roquette-Pinto, o Espaço Afluentes)

 

A 3ª edição recebeu o acadêmico, professor e ensaísta Antonio Carlos Secchin, cujo humor nos reservou momentos muito divertidos aliados ao seu vasto conhecimento dos estilos e escolas literárias.

(Sempre uma alegria receber os poetas amigos — da esquerda para direita: Luiz Otávio Oliani, Cláudio Cacau, Nuno Rau, Claudia Roquette-Pinto, administradora com a sua irmã, Mariana Roquette-Pinto, do Espaço Afluentes, o nosso convidado Antonio Carlos Secchin, Anna Maria Fernandes, Carmen Moreno e Tanussi Cardoso)

 

A 4ª edição recebeu o professor e tradutor Paulo Henriques Britto, que nos deu uma verdadeira aula de versificação, metrificação e tradução de poesia no Brasil e em alguns outros cantos do mundo.

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A vocês, de brinde, dois poemas do nosso próximo convidado.

Beijo todos!
Paulo Sabino.
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(do livro: A cor da palavra. autor: Salgado Maranhão. editoras: Imago / Fundação Biblioteca Nacional.)

 

PRINCIPALMENTE: A VOZ DO MAR
17 de abril de 2014

O mar & sua voz

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sempre fui bem tratado, sempre fui tratado bem, com carinho, com respeito, sempre vontades satisfeitas. por isso mesmo, sempre fui bem tratado, sempre fui muito tratado, sempre fui bastante tratado, como um príncipe.

com isso, fui me afeiçoando aos privilégios, aos florilégios (às coleções de flores devidamente escolhidas), às vilegiaturas (às férias que se passa fora dos centros urbanos, no campo, na praia, na montanha, no deserto), que me couberam neste reino — que é a vida — etéreo (sublime, magnífico, elevado, e também vaporoso) & ao mesmo tempo deletério (aviltante, insalubre, danoso).

a vida, sabe-se, possui a sua faceta exuberante como também a faceta cariada, feia, cheia de tristezas.

além disso, neste reino que é a vida, etéreo & deletério, o esquecimento é tão inevitável quanto a vida & a morte é toda feita de mistério.

a vida é uma coisa da qual não se pode dispor. não conhecemos o suficiente para saber, apreender, o que é a existência mundana & universal — a morte, para nós, ainda é um mistério, não se sabe muito a respeito dela, para onde vamos, se é que vamos para algum lugar além das nossas sepulturas, nem nunca podemos ter a apreciação total das nossas próprias vidas, pois, pelo caminho, vamos deixando acontecimentos para trás, justamente porque o esquecimento é tão inevitável quanto a vida.

procuro ouvir a minha sorte, procuro ouvir o que me destina o destino (será que existe destino?), nos meus búzios, como o — poeta olavo — bilac ouvia suas estrelas (vide o poema feito pelo poeta, “ouvir estrelas”), coisa que nunca ouvi, mas compreendi (a minha sorte), mesmo não tendo credo acreditável, mesmo não tendo crença crível, mesmo não tendo credo no qual se possa confiar & acreditar.

assim, bicho homem sem credo no qual se possa confiar & acreditar, fui construindo meu edifício sobre essa arquitetura de quimeras (na vida, sempre fui bem tratado, sempre fui tratado bem, com carinho, com respeito, sempre vontades satisfeitas, e, por isso mesmo, sempre fui bem tratado, sempre fui muito tratado, sempre fui bastante tratado, como um príncipe), cujo arquiteto (o arquiteto dessa arquitetura de quimeras que é a vida: “deus”, ou como quer que se chame a força criadora do universo) talvez fosse cego (construindo tal arquitetura às escuras), ou gênio (construindo tal arquitetura com total entendimento do que construía), ou talvez fosse, simplesmente, ausente (simplesmente inexistente, e a vida, um grande capricho do acaso).

neste reino etéreo & deletério, fundo a minha voz, inauguro o meu canto: na nave língua em que me navego, só me navego “eu”, como “nave”, sendo língua.

(“navego”: na palavra em destaque, duas outras palavras cabem, duas outras palavras formam a palavra “navego”: “nave” + “ego”, que é o mesmo que “eu”. é na língua que posso, através das palavras, me fazer “nave”, e, com elas, o “ego” “navego”.)

na nave língua em que me navego, língua na qual em/barco, só me navego “eu” (“ego”), como “nave”, sendo língua.

a língua é minha pátria. eu canto, falo, declamo, exponho, penso, logo existo, em língua portuguesa.

me navego em língua, “nave” & “ave”.

(“navego”: na palavra em destaque, além de caberem as palavras “nave” & “ego”, uma outra também cabe: “ave”.)

em língua me navego, “nave” que me permite viajar caminho afora, “ave” que me leva em suas asas, na minha tentativa de vôos altos por sobre a vida.

eu sou sol, luz, eu esplendo, eu resplandeço, eu brilho intensamente, sendo sonhador (afinal, fui construindo meu edifício sobre essa arquitetura de quimeras), eu, sendo esplendor, sendo brilho intenso, eu espelho especiaria, sou como o conjunto de temperos que dá aroma & sabor, eu, navegante (dos mares da vida), sou o antinavegador de moçambiques, goas, calecutes, o antinavegador porque nunca me aventurei a descobertas ultramarinas, o antinavegador porque nunca me prontifiquei a vencer os mares em busca de reinos perdidos & tesouros inexplorados, eu, que dobrei & venci o cabo da esperança (sentimento de quem confia na realização daquilo que deseja), eu, que desinventei o cabo das tormentas (das tempestades violentas, das situações conturbadas & perturbadoras), eu, que inventei o vento que me carregou nas minhas andanças, eu, que inventei a “taprobana”, a ilha que só existe na minha ilusão (“taprobana” é o nome pelo qual a ilha de sri lanka era conhecida na antigüidade), eu, que inventei a ilha que não há, talvez “ceilão”, sei lá (“ceilão” foi como a ilha de sri lanka foi denominada até 1972), eu, que inventei o mapa, o astrolábio, a embarcação, a rota, só sei que fui em busca dos meus interesses & sonhos & nunca mais voltei.

me derramei & me mudei em mar — virei a sua voz, me transformei no seu canto, só sei que me morri de tanto amar na aventura das velas caravelas (por todo o fascínio que sempre me despertaram as grandes navegações & suas expedições mundo afora), só sei que morri de tanto amar em todas as saudades de aquém-mar, em todas as saudades que ficam, que permanecem, na parte de cá, neste lado daqui, de quem nunca se lançou em aventuras de além-mar, de quem, viajando em sonhos & desejos, fundou o seu edifício neste reino etéreo & deletério, fundou o seu edifício sobre essa arquitetura de quimeras, cujo arquiteto talvez fosse cego, ou gênio, ou, simplesmente, ausente.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Poemas reunidos. autor: Geraldo Carneiro. editoras: Nova Fronteira / Fundação Biblioteca Nacional.)

 

 

PRINCIPALMENTE

 

sempre fui bem tratado como um príncipe
e fui me afeiçoando aos privilégios
aos florilégios e às vilegiaturas
que me couberam neste reino etéreo
e deletério, porque o esquecimento
é tão inevitável quanto a vida
e a morte é toda feita de mistério.
procuro ouvir a sorte nos meus búzios
como o Bilac ouvia suas estrelas,
coisa que nunca ouvi, mas compreendi
mesmo não tendo credo acreditável.
fui construindo assim meu edifício
sobre essa arquitetura de quimeras,
cujo arquiteto talvez fosse cego,
ou gênio, ou simplesmente ausente.

 

 

A VOZ DO MAR

 

na nave língua em que me navego
só me navego eu nave sendo língua
ou me navego em língua, nave e ave.
eu sol me esplendo sendo sonhador
eu esplendor espelho especiaria
eu navegante, o antinavegador
de Moçambiques, Goas, Calecutes,
eu que dobrei o Cabo da Esperança
desinventei o Cabo das Tormentas,
eu que inventei o vento e a Taprobana,
a ilha que só existe na ilusão,
a que não há, talvez Ceilão, sei lá,
só sei que fui e nunca mais voltei
me derramei e me mudei em mar;
só sei que me morri de tanto amar
na aventura das velas caravelas
em todas as saudades de aquém-mar