SOMOS TROPICÁLIA — 50 ANOS DO MOVIMENTO — 3º CICLO: JULIANA LINHARES, MIHAY, HELIO MOULIN E SALGADO MARANHÃO — MÃE DA MANHÃ (GILBERTO GIL)
18 de abril de 2017

(Os participantes desta 3ª etapa do projeto: em pé, Juliana Linhares e Salgado Maranhão; sentados, Helio Moulin e Miray junto ao Guilherme Araújo e à Gal Costa — Foto: Rafael Millon)
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“Bravo, Paulo Sabino. Aqueceram-me o coração sua desenvoltura e alta voltagem poética. Grato. Abs. RCAlbin”.

(Ricardo Cravo Albin — musicólogo & membro da Academia Carioca de Letras — ACL)

 

“Que massa que o Helinho vai tocar contigo [Mihay]! Adorei.”

(Tulipa Ruiz — cantora e compositora)

 

 

Alô Alô! Alegria Alegria!

Aqui para anunciar os participantes da 3ª etapa de encontros do projeto “Somos Tropicália”, em homenagem aos 50 anos do movimento que chacoalhou a música popular brasileira. O projeto vem reunindo, desde fevereiro, mensalmente, artistas da nova geração da nossa música, para a releitura das canções tropicalistas, com poetas consagrados, para a leitura de textos/poemas de bossa tropicalista.

Para esta edição de abril, o imenso prazer de receber só feras: a atriz e cantora Juliana Linhares (cantora e integrante da banda “Pietá” e do projeto “Iara Ira”, ao lado das cantoras Júlia Vargas e Duda Brack), o cantor, compositor e videomaker Mihay (o Mihay já cantou com o Chico César, excursionou com o João Donato, e tem, no seu segundo disco, participação da Tulipa Ruiz, Mariana Aydar, do Robertinho Silva, Kassin, e do próprio João Donato, entre outros), o instrumentista-violonista Helio Moulin (o Hélio é filho do monstro violonista e guitarrista da música popular brasileira e do jazz Helio Delmiro, que tocou com Elis Regina, Clara Nunes, Milton Nascimento, a diva da música norte-americana Sarah Vaughan, entre outros), e o poeta vencedor do prêmio Jabuti de poesia (o mais importante prêmio literário, pelo seu belíssimo livro “Ópera de nãos”) Salgado Maranhão.

Tudo divino-maravilhoso! Certeza de mais noites lindas para a música e para a poesia! E toda essa maravilhosidade “di grátis”!

Depois deste texto sobre o “Somos Tropicália”, um poema-canção que não é tropicalista porém foi composto por um mestre tropicalista e cantado pela musa tropicalista — Gilberto Gil e Gal Costa. Isso porque a Juliana Linhares, que é a grande cantora e intérprete que terei o prazer e a honra de receber no projeto, no espetáculo “Iara Ira”, canta com a Julia Vargas e a Duda Brack o poema-canção da publicação, poema-canção que é o meu preferido do álbum em que foi lançado, “O sorriso do gato de Alice”, da Gal. A Juliana, a Julia e a Duda abrem o “Iara Ira” com este poema-canção.

Sobre o “Somos Tropicália”: espalhem a notícia! Compartilhem a boa nova!

Esperamos todas e todos!

 

Serviço:

Gabinete de Leitura Guilherme Araújo apresenta –

SOMOS TROPICÁLIA – 50 anos do movimento

Juliana Linhares, Mihay, Helio Moulin e Salgado Maranhão / Pocket-show e leitura de poesias
Dias 26/04 (4ª-feira) e 27/04 (5ª-feira)
A partir das 19h30
Rua Redentor, 157 Ipanema
Tel infos. 21-2523-1553
Entrada franca c/ contribuição voluntária
Lotação: 60 lugares
Classificação: livre

Link do evento no Facebook: http://www.facebook.com/events/1881892262099199/
Página do projeto no Facebook: http://www.facebook.com/somostropicalia/
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(Extraído do livro “Gil — todas as letras”, organizado por Carlos Rennó, editora Companhia das Letras.)

 

para Gal Costa & Juliana Linhares

 

 

gilberto gil fez este poema-canção para gal costa, que foi dedicado à mãe da cantora, mariah costa penna, amiga do poeta-compositor & que havia morrido há pouco tempo.

a perda de uma pessoa que muito se ama, a que mais se ama, a grande amiga, aquela que sentimos ser a única pessoa a fazer absolutamente tudo & qualquer coisa para o bem-estar da cria, dos filhos: uma dor profunda, uma tristeza abissal, o recolhimento, o luto, a escuridão.

meu canto em momentos de escuridão é o meu grande amparo. minha voz é meu amparo em momentos difíceis.

minha voz, que é um aro de luz da manhã, que é um aro de luz que nasce do dia, voz solar, iluminada, voz brilhante, num momento de dor, de perda de alguém tão caro, a minha voz brota na gruta da dor.

mãe da manhã, mãe do raiar do dia, mãe da luz nascente do dia, mãe maria, mãe de todos nós, eu faria de tudo pra conservar vosso amor.

uma espécie de súplica, de pedido, à mãe da manhã, à mãe do raiar do dia, à mãe da luz nascente do dia, à mãe maria, à mãe de todos nós: pra conservar vosso amor, mãe da manhã, eu faria de tudo — a cada ano, eu faria uma romaria, eu faria uma oferenda, eu faria uma prenda, eu daria a vós uma flor. faria uma romaria, uma oferenda, uma prenda, daria uma flor — tudo para conservar o amor da mãe da manhã.

assim, na minha existência, a cada instante, teria direito a um grão, a um momento, a um pedaço, de alegria — e todos os grãos de alegria, por conservar o amor da mãe da manhã, seriam lembranças do vosso amor, lembranças do amor que a mãe da manhã me dedica.

santa virgem maria — mãe maria, mãe de todos nós —, vós que sois mãe do filho daquele que nos permite o nascer do dia, vós que sois mãe do filho daquele que nos possibilita a vida, daquele que nos determina a morte, santa virgem maria, mãe da manhã, mãe da luz, mãe solar: abençoai minha voz, meu cantar.

na escuridão da nostalgia causada pela perda de alguém que muito se ama, pela perda de alguém que nos é tão importante, tão caro, dai-nos a luz do luar.

na noite, na escuridão, na dor, na perda, no momento difícil: luz, sempre. seja qual for: solar ou lunar: luz, quero luz.

mãe da manhã, que assim seja.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Gil — Todas as letras. organização: Carlos Rennó. autor: Gilberto Gil. editora: Companhia das Letras.)

MÃE DA MANHÃ

Meu canto na escuridão
Minha voz, meu amparo
Aro de luz nascente do dia
Brota na gruta da dor
Mãe da manhã, de tudo eu faria
Pra conservar vosso amor

A cada ano, uma romaria
Uma oferenda, uma prenda, uma flor
A cada instante, um grão de alegria
Lembranças do vosso amor

Santa Virgem Maria
Vós que sois Mãe do Filho do Pai do Nascer do Dia

Abençoai minha voz, meu cantar
Na escuridão dessa nostalgia
Dai-nos a luz do luar.

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(do site: Youtube. áudio extraído do álbum: O sorriso do gato de Alice. gravadora: BMG Ariola. artista e intérprete: Gal Costa. canção: Mãe da manhã. autor: Gilberto Gil.)

FERREIRA GULLAR — UM RAIO AOS CÉUS NO DIA DA RAINHA DOS RAIOS
8 de dezembro de 2016

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(Na foto, a dedicatória do poeta no meu exemplar de “Toda poesia”.)
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No dia de Iansã, dia da rainha dos raios, parte um raio luminoso da poesia brasileira.

Ferreira Gullar, sem sombra de dúvidas, foi dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos. Transitou por todos os estilos poéticos, incluindo o concretismo & o neo-concretismo, com brilhantismo & escreveu artigos & ensaios sobre literatura da maior importância. Um gênio da raça.

Ferreira Gular: 10 de setembro de 1930 / 4 de dezembro de 2016. Oitenta & seis anos de plena poesia.

Salve Gullar!
Salve sua poesia em nossos corações & mentes!

Saravá!

Beijo todos!
Paulo Sabino.
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(do livro: Em alguma parte alguma. autor: Ferreira Gullar. editora: José Olympio.)

 

 

REFLEXÃO SOBRE O OSSO DA MINHA PERNA

 

A parte mais durável de mim
são os ossos
e a mais dura também

como, por exemplo, este osso
da perna
que apalpo
sob a macia cobertura

ativa
de carne e pele
que o veste e inteiro
me reveste
dos pés à cabeça
esta vestimenta
fugaz e viva

sim, este osso
a mais dura parte de mim
dura mais do que tudo o que ouço
e penso
mais do que tudo o que invento
e minto
este osso
dito perônio

é, sim,
a parte mais mineral
e obscura
de mim
já que à pele
e à carne
irrigam-nas o sonho e a loucura

têm, creio eu,
algo de transparente
e dócil
tendem a solver-se
a esvanecer-se
para deixar no pó da terra

o osso
o fóssil

futura
peça de museu

o osso
este osso
(a parte de mim
mais dura
e a que mais dura)
é a que menos sou eu?

 

 

UMA PEDRA É UMA PEDRA

 

uma pedra
(diz
o filósofo, existe
em si,
não para si
como nós)

uma pedra
é uma pedra
matéria densa
sem qualquer luz
não pensa

ela é somente sua
materialidade
de cousa:
não ousa

enquanto o homem é uma
aflição
que repousa
num corpo
que ele
de certo modo
nega
pois que esse corpo morre
e se apaga

e assim
o homem tenta
livrar-se do fim
que o atormenta

e se inventa

 

 

UM POUCO ANTES

 

Quando já não for possível encontrar-me
em nenhum ponto da cidade
ou do planeta
pensa
ao veres no horizonte
sobre o mar de Copacabana
uma nesga azul de céu
pensa que resta alguma coisa de mim
por aqui
Não te custará nada imaginar
que estou sorrindo ainda naquela nesga
azul celeste
pouco antes de dissipar-me para sempre

CRISTIANO MENEZES: POETA DE PRIMEIRA GRANDEZA, PESSOA DE PRIMEIRA LINHA
5 de setembro de 2016

Cristiano Menezes & Paulo Sabino

(Cristiano Menezes & Paulo Sabino)

Cristiano Menezes

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(A dedicatória para o meu exemplar de “Guardanapos”, livro de Cristiano Menezes)

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(Cristiano Menezes no projeto “Ocupação Poética”, coordenado por Paulo Sabino)
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Uma notícia tristíssima, que me deixou atônito desde recebida. Desde a notícia, querendo escrever sobre o acontecido, mas cadê palavra para começar? Pela falta, começo pelo início: quinta-feira, primeiro de setembro (01/09/2016), faleceu o querido amigo & grande poeta CRISTIANO MENEZES.

Cristiano Menezes: poeta de primeira grandeza, pessoa de primeira linha.

Eu, desde que conheci o Cristiano Menezes, através de outro grande poeta & querido amigo, Luis Turiba, apaixonei-me de imediato: por sua limpidez de alma, por sua bondade, por sua generosidade, por sua cordialidade, por seu carisma, por sua inteligência. Uma pessoa absolutamente apaixonante por tudo absolutamente. Honra & prazer poder conhecê-lo & trabalhar com o Cris, tê-lo como PARTE VIVA da história do projeto que coordeno, o Ocupação Poética (no dia em que o Cris fez o projeto ao lado do Luis Turiba, 9 de setembro, era aniversário dele & fizemos, no teatro Cândido Mendes, uma grande festa, digna do aniversariante).

Ele internou para operar & um dia antes da operação, falamo-nos. Prometi-lhe uma visita assim que ele deixasse o hospital. Não deu… Um nó na garganta, um choro preso no peito.

A notícia me bateu feito porrada pesada & inesperada. Imagine uma porrada numa situação inimaginável, que de tão inimaginável, de tão inesperada, até agora, não se entende de onde veio o soco. Esta é a sensação que me resta neste momento.

Como homenagem, três poemas do poeta + o vídeo de encerramento da sua noite no projeto que coordeno, o Ocupação Poética, noite linda, onde o Cris comemorou o seu aniversário — que está chegando, 9 de setembro.

Parabéns por tudo, Cris! Saúdo a sua existência!

Poeta de primeira grandeza, pessoa de primeira linha.

Nunca, por mim, os ensinamentos dos seus versos, da sua poética, serão esquecidos: sempre comigo mesmo, pois a jornada que é a vida é de cada um, a jornada que é a vida é intransferível, é inadiável, sem cordão que me proteja (do cordão, só a marca no umbigo), solto no mundo, solto para o próximo passo, livre para saborear os acontecimentos, senhor de mim, senhor dos meus desejos, senhor das minhas vontades, sempre pronto a conhecer, a desvendar, o novo, o inédito, sempre mantendo-me único, ímpar, longe do que se repita, do que seja mera cópia.

Ser genuíno, ser Paulo Sabino, como Cristiano Menezes foi genuinamente Cristiano Menezes.

(E que nunca se apague, que seja perene o endereço da origem do afeto, que nos faz sentir & merecer o calor dos apreços.)

Salve o poeta & amigo!

Tenho certeza de que os deuses & as musas estão em festa por receber poeta do seu quilate & pessoa da sua grandeza.

Saudades imensas, Cris. Sempre.

Saravá!

Beijo todos e, especialmente, o Cris.
Paulo Sabino.
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(do livro: Guardanapos. autor: Cristiano Menezes. editora: 7Letras.)

 

 

COMIGO MESMO

 

Não tenho mais o cordão
dele só a marca no umbigo
com frio no coração
aprendi o calor dos amigos

Podia ter morrido
junto com tudo o que matei
mas nasci atento
pras coisas que ainda não sei

E assim, a cada novo dia,
sempre dono do meu nariz
vivo o medo e a alegria
de quem está sempre por um triz

Na corda bamba é que se vê quem é
o passo adiante é pra quem está solto
lá embaixo a plateia está de pé
aqui no peito o meu mar revolto

O salto é meu
a mão, do companheiro,
e só quando me lanço
é que me sinto inteiro

Agradeço a carona
mas sou filho de mim mesmo
do norte, do sul
da minha vida a esmo

 

 

AOS MEUS FILHOS

 

Quando nascemos
herdamos o que antes foi feito
línguas canções
ritmos comidas
roupas jeitos

São signos que ficam
porque significam
pontos que se tecem
elos que se multiplicam

E que de nó em nó
haja sempre o novo
de Colombos destemidos
a descobrir o além
dos horizontes presumidos

Este é o desafio
da meada que nos compete
viver a inédita experiência que somos
manter-nos únicos
longe do que se repete

Mas na memória
esteja sempre o cais
de onde partimos
eterno porto
que não veremos jamais

E que nunca se apague
seja o perene endereço
a origem do afeto
que nos faz sentir e merecer
o calor dos apreços

 

 

CURRICULUM VITAE

 

Ginásio no São Bento
e Zé Bonifácio
clássico no Santo Inácio
o que não foi fácil
Cheguei a estudar Direito
mas saí errando por aí…
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(do site: Youtube. projeto: Ocupação Poética [2ª edição] — Teatro Cândido Mendes. local: Rio de Janeiro. data: 09/09/2015. Encerramento da noite, por Paulo Sabino, e o Parabéns pra você ao poeta aniversariante Cristiano Menezes.)

ALL STAR: ESTRANHO SERIA SE EU NÃO ME APAIXONASSE POR VOCÊ
15 de dezembro de 2015

Cássia Eller

All Star Azul
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“Ô meu bem, obrigada. Me emocionei com sua homenagem à Cássia. Vou te mandar o que escrevi quando a perdemos. Beijos poéticos procê, Paulo!”

(Elisa Lucinda — poeta, atriz & dramaturga)


“Querido Paulo Sabino,

Elisa Lucinda merece amplo reconhecimento . Sua poesia arrebata, não trai . Sou sua leitora e já me pronunciei sobre ela em diversas ocasiões.

O abraço afetuoso da

Nélida Piñon”.

(Nélida Piñon — escritora & membro da Academia Brasileira de Letras — ABL)

 

Estou com ela muito presente na minha cabeça.

Se entre nós, ela teria aniversariado há pouco. O título do seu último álbum (eu possuo absolutamente todos, inclusive o de gravações avulsas), lançado depois da sua morte, é a data do seu aniversário — 10 de dezembro.

Quem me conhece, os amigos do peito, sabe que, depois de Maria Bethânia, a grande responsável por trazer poesia à minha vida, a intérprete/cantora que mais me emociona, mais me comove, por quem sou louco de paixão até hoje, é ela — Cássia Eller.

Cássia, até hoje, faz uma falta abissal na minha existência, como nenhuma cantora até então. Assim como Bethânia, tinha a capacidade de revelar belezas — antes ocultas — nas canções que escolhia para cantar, simplesmente pelo seu modo de mastigá-las & devolvê-las ao ouvinte/espectador.

Para mim, foi a maior que tivemos. Nunca fabricaremos algo tão potente quanto Bethânia & Cássia.

Por tanto, por tudo, em sua homenagem, esta canção, feita para ela por um amigo & parceiro de estrada. Uma canção que me emociona muitíssimo, porque eu realmente gostaria de tê-la conhecido, gostaria imensamente de ter tido a chance de uma conversa, um bate-papo.

A canção é uma declaração de amor à amizade que envolveu, muito rapidamente, o autor & a grande intérprete das suas canções.

Uma curiosidade: à época em que trabalhei num programa de tv exibido pela extinta TV Educativa (TVE – RJ), que é a mesmíssima época do lançamento desta canção, a chefe geral do meu setor, e também diretora do programa de cuja equipe fiz parte, era vizinha da Cássia. De fato, Cássia morava em Laranjeiras, no 12º andar (minha ex-chefe & a Cássia foram vizinhas de porta).

Essa “proximidade” da minha ex-chefe com a Cássia — vizinhas de porta — me trazia uma certa sensação de “intimidade” com a cantora, pelas “histórias de vizinhança” que me chegavam.

(Estranho, mas me sinto como um velho amigo da Cássia…)

Vivas a ela, vivas à sua voz, vivas à sua presença na minha vida!

Beijo todos!
Paulo Sabino.
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(do encarte do cd: Para quando o arco-íris encontrar o pote de ouro. artista: Nando Reis. autor dos versos: Nando Reis. gravadora: Warner Music.)

 

 

ALL STAR

 

Estranho seria se eu não
me apaixonasse por você
O sal viria doce para os novos lábios
Colombo procurou as Índias
mas a Terra avisto em você
O som que eu ouço são as gírias
do seu vocabulário

Estranho é gostar tanto
do seu All Star azul
Estranho é pensar que o bairro das
Laranjeiras
Satisfeito, sorri
Quando chego ali
E entro no elevador
Aperto o doze que é o seu andar
Não vejo a hora de te encontrar
E continuar aquela conversa
Que não terminamos ontem
E ficou pra hoje

Estranho mas já me sinto
como um velho amigo seu
Seu All Star azul combina com o meu,
preto, de cano alto
Se o homem já pisou na Lua
como ainda não tenho o seu endereço?
O tom que eu canto as minhas músicas
pra tua voz parece exato

Estranho é gostar tanto
do seu All Star azul
Estranho é pensar que o bairro das
Laranjeiras
Satisfeito, sorri
Quando chego ali
E entro no elevador
Aperto o doze que é o seu andar
Não vejo a hora de te encontrar
E continuar aquela conversa
Que não terminamos ontem

Laranjeiras
Satisfeito, sorri
Quando chego ali
E entro no elevador
Aperto o doze que é o seu andar
Não vejo a hora de te encontrar
E continuar aquela conversa
Que não terminamos ontem
E ficou pra hoje
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(do site: Youtube. áudio extraído do álbum: Para quando o arco-íris encontrar o pote de ouro. artista & intérprete:Nando Reis. canção: All Star. autor da canção: Nando Reis. gravadora: Warner Music.)


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(do site: Youtube. artista & intérprete:Cássia Eller. canção: All Star. autor da canção: Nando Reis.)

É COMO AMAR: O UIRAPURU SABE
1 de dezembro de 2015

Pai

Pai Eu no colo

(Nas fotos, o primeiríssimo Paulo Sabino; no colo, o seu sucessor.)
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se entre nós, um dos responsáveis pela minha existência, o paulo sabino primeiro, venceria, hoje (01/12), as suas setenta & três primaveras.

há onze anos — outubro de 2004 — ele pulava fora deste plano para cair dentro, única & exclusivamente, das minhas lembranças, do meu sentimento, do meu coração.

há onze anos ele veio fazer sua morada, única & exclusivamente, dentro de mim.

porém, o seu legado de amor & bom-humor me habita desde sempre.

filho de um violonista baiano, foi um apaixonado pela língua portuguesa, tinha uma grande queda pela língua francesa, um sambista nato (foi diretor de harmonia de uma escola de samba do rio de janeiro por dez anos) & um piadista irremediável.

e é bacana ver como hoje o seu legado, em todos os níveis & sentidos, ecoa de forma bonita em mim como também na minha mãe.

mora & dorme em mim o meu menino grande.

todo o amor que houver nesta vida para você, sabino pai, e algum veneno antimonotonia para todos nós!

parabéns, pai! vivas ao dia que o trouxe ao mundo!

saravá!

beijo todos!
sabino filho.
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(do livro: Campo de milagres. autor: Thiago de Mello. editora: Bertrand Brasil.)

 

 

O UIRAPURU SABE

 

Não me queixo, antes celebro,
esse dom de florescer
que cada palavra traz
de nascença, por milagre.
Só quis contar como faço,
pondo amor no meu fazer,
como o uirapuru só canta
quando precisa cantar.

 

 

É COMO AMAR

 

Sou poeta, sou simplesmente
um ser limitado e triste,
sujo de tempo e palavras.
Contudo, capaz de amor.
Que este ofício de escrever,
sem tirar nem pôr, é o mesmo
que o ofício de viver;
quero dizer o de amar.

MEDITAÇÃO
5 de novembro de 2015

Jasmim solitário

Flor_do_Jasmim

(Jasmim)
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“Fiquei comovida diante da bela homenagem que presta à grande poeta e querida amiga Natália Correia. Muito grata.

O abraço da

Nélida Piñon”.

(Escritora & membro da Academia Brasileira de Letras — ABL)

 

 

meditação (sobre as coisas):

a carne é flor ou conseqüência do seu perfume?

é flor o que designamos ser flor apenas pelas formas que abrigam, pelos formatos da sua carne, ou flor é conseqüência do perfume que exala?

será que o en-canto reside na flor, na sua carne, ou tal encanto provém, antes, do perfume que a flor exala?

por exemplo, o jasmim, flor do meu absoluto delírio (meditação): eu sou um apaixonado por jasmim. não há um pé por onde passe, na cidade do rio de janeiro, e que não demarque em minha memória. sempre que há pelo chão, pego uma, duas, até três flores, e sigo respirando o seu perfume. é quase uma alucinação, uma droga. amo jasmim (as pétalas branquíssimas, e, no seu miolo, uma espécie de sol que a tudo ilumina), sobretudo o seu perfume.

seja o que for a flor, o que a resume é: intensidade — sua forma, suas cores, sua textura, sua delicadeza, sua beleza, seu perfume.

a mão é gesto que a ultrapassa. a mão, sem o gesto que a faça mover-se, não serve de nada. a mão é mão porque, sobretudo, é gesto. o gesto é que é além. porque a mão toca o horizonte que o gesto da mão contém. é o gesto da mão que nos levará a tocar, a alcançar, o horizonte que nos cabe.

o homem canta. e, enquanto canta, o homem dura. porque o seu canto é perceber que a voz prevalece à criatura. semeando seu canto de amor, de bem viver & querer, o homem perdura na força das suas palavras. sabemos que, um dia, não mais faremos parte do convívio social, um dia somos forçados a nos retirar. o que nos faz eternos, duradouros, é o legado destinado aos que ficam.

que sirva sempre à meditação este canto de página, este espaço de prosa em poema.

que prevaleça, por sobre tudo & todos, o canto dos versos.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Poesia completa — O sol nas noites e o luar nos dias. autora: Natália Correia. editora: Dom Quixote.)

 

 

MEDITAÇÃO

 

A carne é flor ou consequência do seu perfume?
Seja o que for
é intensidade que a flor resume.

A mão é gesto que a ultrapassa. O gesto é além.
Porque a mão toca o horizonte
que o gesto da mão contém.

O homem canta.
E enquanto canta o homem dura.
Porque o seu canto é perceber
que a voz prevalece à criatura.

OCUPAÇÃO POÉTICA – TEATRO CÂNDIDO MENDES: O EVENTO
4 de agosto de 2015

Poetas Ocupação Poética Cândido Mendes

(Os participantes do projeto “Ocupação Poética”: em pé: Salgado Maranhão, Adriano Espínola, Antonio Carlos Secchin, Alex Varella & Antonio Cicero; abaixados: Paulo Henriques Britto & Paulo Sabino.)

Ocupação Poética_Plateia 2

Ocupação Poética_Plateia

(Casa cheia — platéia do teatro Cândido Mendes.)

Adriana Calcanhotto e Paulo Sabino

(Na platéia, uma das minhas musas, a cantora & compositora Adriana Calcanhotto.)

Ocupação Poética_Geraldo Carneiro & Paulo Sabino

(Paulo Sabino & um dos grandes mestres da poesia, que estava na platéia, Geraldo Carneiro, rosados.)
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Na primeira foto, o TIMAÇO de poetas escalado para o projeto “OCUPAÇÃO POÉTICA – TEATRO CÂNDIDO MENDES” (Ipanema – RJ), acontecido nos dias 31/07, 01/08 & 02/08.

Só CRAQUES! Bateram um bolão!

O projeto foi tão bonito, tão emocionado, tudo deu tão certo, que surgiu a idéia (e o mais bacana: a idéia partiu dos próprios poetas participantes!) de fazermos, neste mesmo formato, um fim de semana em SÃO PAULO!

Estou SUPER animado & vou batalhar para que este desejo (de todos nós!) se torne realidade!

Eu sou PURA GRATIDÃO! Só tenho a agradecer a TODOS OS MESTRES que confiaram em mim, de peito aberto, para a coordenação dos saraus, todos EXUBERANTES!

Vamos que vamos, porque, no que depender de mim, levaremos POESIA aos quatro cantos do mundo!

“A poesia sopra onde quer”, versejou Murilo Mendes. E eu concordo plenamente.

(Em breve, videozinhos com algumas leituras.)

Aos senhores, uma das poesias da seleção do poeta Alex Varella, poesia que fez bastante sucesso na sua leitura. E muito divertida, bem-humorada, leve, como foi todo o evento.

Beijo todos!
Paulo Sabino.

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(autor: Décio Escobar.)

 

 

VICENTE

 

 

Dei à minha morte o nome de Vicente.
Anotei Vicente num cartão
e guardei Vicente no bolso do paletó.
Para cima e para baixo eu ando com Vicente;
Vicente é um silogismo, uma consumição, mas
não chega a ser a dor.
Encontro Vicente quando vou pegar o ônibus,
o lotação, a entrada para o teatro; Vicente
transita de um bolso para outro,
misturou-se com os meus papéis,
o meu passaporte, a minha identidade, o telefone
da Margarida… o diabo.
Vicente anda amarfalhado, apalpado, usado;
dobro e desdobro Vicente.
Um dia
eu perco Vicente
na rua, na praia, no escritório,
e vai e alguém acha Vicente — e pronto, e eu
fico ETERNO.

ESTA PLACA
28 de abril de 2015

Eucanaã Ferraz

(Na foto, o poeta Eucanaã Ferraz.)
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note-se: o nome “eucanaã”, além de iniciar com o pronome da primeira pessoa do singular, “eu”, significa, em hebraico, “terra prometida”, a terra que, segundo a bíblia, deus assegurou aos descendentes de abraão — “canaã”.

esta placa: o nome do poeta: “eucanaã”, que é como se ele mesmo dissesse: “eu, canaã! eu, terra prometida!”

é como se ele próprio afirmasse — afinal, começa com “eu” o nome do poeta — que ele é o que o nomeia: “eu, canaã! eu, terra prometida!”

“canaã”, que é o mesmo que “terra prometida”: lugar de não ser ainda, solo tão só prometido, projeto de geografia para depois de amanhã, para um dia (quem sabe).

o nome do poeta, “terra prometida”, não é o poeta agora, pois ele não é terra que se prometeu a alguém ou a algum feito & a terra que forma o seu nome é uma terra ainda no mundo das promessas, isto é, no mundo futuro.

o poeta não existe no seu nome (o poeta não é terra que se prometeu a alguém ou a algum feito). o nome é uma coisa que vive sem ele.

o nome, terra prometida (“canaã”), se diz sendo o poeta, este nome que o afirma (“eu, canaã!”), mas o que nele — no nome — aponta o poeta é também o que o acusa de não ser o que o nome diz: o poeta não é o que seu nome diz que ele é: terra que se prometeu a alguém ou a algum feito.

o poeta queria viver sem nome, ser o que ele é: ao invés de “eu-canaã”, ao invés de “eu-terra prometida”, ser “eu-ninguém”.

chamarem-no — ei, você! — & o poeta se reconheceria perfeitamente não sendo senão uma coisa livre do que jamais prometeu.

mas à cara, mas no rosto, do poeta está colada esta placa (certas tintas, como as do nome, não se apagam), “eu-canaã”, este engano à beira de “ele-estrada”, esta placa à beira do poeta, que se vê estrada, que se vê caminho & que se faz caminho no andar dos passos.

se terra, como aponta o seu nome, o poeta é terra a terra, como os passos (passo a passo), o poeta é o agora, é o já, é o neste instante, sem vaticínios — sem previsões, sem profecias — de um norte, de um lugar na terra, em que mel & leite jorrassem fáceis, sem dor.

o poeta não existe no nome, não é terra que se prometeu a alguém ou a algum feito. o poeta só existe em chão estreito, em chão delgado, em chão apertado, em chão onde cabem uns versos de amor & morte, palavras ditas no escuro: fósforo (a luz mínima que conseguimos acender com o conhecimento mínimo que alcançamos da existência escura), poço (lugar escuro, sem saída), você (o outro, lugar também escuro, repleto de mistérios).

o poeta é o exilado do nome que carrega, sem ter nunca visto a pátria que mente (a tal “terra prometida”) toda vez que responde: “como é que você se chama?”

o poeta vai aos livros, não encontra a pátria que mente. o poeta pergunta. não está no atlas.

e o infinito infinito: o solo que não é encontrado nos livros, no atlas, a pátria que o  poeta mente, a terra para sempre prometida no nome & que nunca se realizará, a terra que não consta em mapa algum.

a terra está cumprida, a terra está efetivada, a terra está realizada, quando estiver concluída, quando estiver terminada, quando estiver acabada. então, o poeta morrerá ali, por sob a terra, dentro dela, sem ser “eu” (sem ser o que o poeta é), sem “eu” (sem a terra-corpo onde todos pousamos enquanto vivos), puro “não ser”.

sem ser eu, sem eu, não ser mais: eu-canaã.

antes disso, antes de o poeta ir morar por sob a terra, antes de o poeta ir morar dentro dela, que esta sua placa continue a indicar caminhos luminosos a quem quer que a encontre estradafora.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Escuta. autor: Eucanaã Ferraz. editora: Companhia das Letras.)

 

 

ESTA PLACA

 

Como se eu mesmo dissesse,
como se eu próprio afirmasse
(começa com eu, meu nome)
que sou o que me nomeia:

lugar de não ser ainda,
solo tão só prometido,
projeto de geografia
para depois de amanhã.

Meu nome não sou agora,
moro no mundo futuro.
Meu pai me deu esse nome
sem que eu pudesse fazê-lo.

Mal posso escrevê-lo certo
nos documentos que o pedem.
Não existo no meu nome,
coisa que vive sem mim.

Ele se diz sendo eu,
este nome que me afirma,
mas o que nele me aponta
é também o que me acusa

de eu não ser o que ele diz.
Queria viver sem nome,
ser o que sou: eu-ninguém.
Me chamarem — ei, você! —

e eu me reconheceria,
perfeitamente não sendo
senão uma coisa livre
do que jamais prometi.

Mas à cara está colada
(certas tintas não se apagam)
esta placa, este engano
à beira de mim-estrada.

Se terra, sou terra a terra,
o agora sem vaticínios
de um norte em que mel e leite
jorrassem fáceis, sem dor.

Só existo em chão estreito,
nuns versos de amor e morte,
palavras ditas no escuro,
fósforo, poço, você.

Sou o exilado do nome
que carrego, vice-versa,
sem ter nunca visto a pátria
que minto quando me digo

toda vez que respondo:
como é que você se chama?
Vou aos livros, não encontro.
Pergunto. Não está no atlas.

E o infinito infinito.

A terra estará cumprida
quando estiver concluída.
Então, morrerei ali,
sob ela, dentro dela,

sem ser eu, sem eu, não ser.

MINHA LINHA
10 de março de 2015

Calçadão de Copacabana_Linhas

(As linhas tortas, ondulantes, feito o mar, do calçadão de Copacabana, Rio de Janeiro.)
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que o dono da fala que mora em mim, que o dono da fala que me habita, aquele que fala por mim, nunca permita que eu saia da linha: a linha que, quanto mais torta, quanto mais errada, quanto mais imperfeita, quanto mais retorcida, quanto mais em desaprumo, quanto mais curva, mais posso dizer que é a minha.

sempre fui meu próprio mestre, sempre aprendi com as coisas que vi, senti, ouvi, e li, e é sem tristeza, e é com alegria, que conto que não aprendi nada: não me considero pronto: a linha que me pertence, na qual escrevo a minha vida, é a linha que, quanto mais torta, quanto mais errada, quanto mais imperfeita, quanto mais retorcida, quanto mais em desaprumo, quanto mais curva, mais posso dizer que é a minha.

no caminhar dos passos, os passos, com o que colhemos vidafora, com o conhecimento que formamos, não se tornam acertados; muito pelo contrário: os passos continuam, e continuarão, incertos, continuarão a caminhar em linha torta (pelo menos os meus).

o conhecimento acumulado não consegue, nunca, acertar os passos em linha reta: você precisa saber o que eu sei & o que eu não sei mais, o que eu pensei, um dia, saber, e que, hoje, sei que não sei, reconheço que não aprendi.

(você precisa saber o que eu sei e, sobretudo, o que eu não sei mais.)

o dono da fala que mora em mim, o dono da fala que me habita, aquele que fala por mim, imerso em matéria tão complexa quanto a arte de entortar a linha, consegue, desse modo, reconhecer-se na beleza de ser um eterno aprendiz.

imerso em matéria tão complexa quanto a arte de entortar a linha, que nem a morte há de, um dia, endireitar.

(cantar & cantar & cantar a beleza de ser um eterno aprendiz.)

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Modelos vivos. autor: Ricardo Aleixo. editora: Crisálida.)

 

 

MINHA LINHA

 

Que o dono da fala
nunca
permita que eu saia
da linha
a linha que
quanto mais torta
mais posso dizer
que é a minha

Sempre fui
meu próprio mestre
e é sem tristeza
que conto
que ainda não aprendi
nada
não me considero
pronto

Em matéria
tão complexa
quanto a arte
de entortar
a linha
que nem a morte
há de um dia
endireitar

É TUDO AMOR
2 de dezembro de 2014

Samambaia

(É tudo amor, e mais coisa nenhuma de que sequer se guarde uma lembrança: na foto, uma samambaia, planta preferida do meu pai, o primeiríssimo Paulo Sabino)
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se entre nós, no primeiro dia do último mês do ano (01/12), o responsável por trazer à luz da vida este que vos escreve, o primeiríssimo paulo sabino, venceria as suas 72 primaveras.

2014: este ano, exatos 10 anos sem a presença dele.

2014: este ano, exatos 10 anos com a presença dele apenas em mim: no meu gestual, na minha alegria de vida, no meu bom-humor, na delicadeza que busco no trato dispensado aos meus demais irmãos de terra: na minha memória.

2014: há exatos 10 anos, o grande paulo sabino, o primeiríssimo, partia deste mundo para tornar-se uma estrela-guia no meu trajeto noite adentro, estrela-guia na obscuridade em que se projeta a existência.

o que há de melhor, em mim, eu devo a ele. tanto devo, que, hoje, o que, antes, foi uma saudade demasiadamente doída, 10 anos depois da sua partida transfigurou-se em lembranças doces. por vezes melancólicas, porém muito doces na sua composição.

filho de um violonista baiano & de uma catarinense, foi envolvido com a música, especificamente com o samba, desde que me entendo por gente (envolveu-se por 10 anos com uma escola de samba do rio de janeiro).

adorava viajar de carro, adorava passeios ao ar livre (o parque do flamengo foi dos seus cenários prediletos), adorava cinema (foi ele quem me apresentou almodóvar, lá atrás, quando o diretor espanhol nem sonhava com o sucesso que alcançou).

adorava dançar em casa, e se acabava quando eu, fascinado por sua presença alegre, iluminada, punha, na vitrola, determinadas canções que o faziam rodopiar pela casa com o seu sorriso farto, de quem nasceu para a amorosidade.

ele foi um apaixonado pela língua portuguesa & admirava & apostava no meu talento para com as letras, desde que me dedico à poesia & à interpretação de poemas.

entre mim & meu velho, meu eterno, meu pai,  é tudo amor, e mais coisa nenhuma de que sequer se guarde uma lembrança, um traço do seu rosto, o fluido passo de uma dança, uma canção — na vitrola antiga — que foge em meio à bruma.

é tudo amor: é tudo o que há na ponta de uma lança que nos fere como áspera verruma (verruma: instrumento de aço que tem a sua extremidade inferior aberta em espiral e terminada em ponta, usado para abrir furos), pois todos sabemos, como já versejou o poetinha, que o amor é a coisa mais triste quando se desfaz, todos sabemos que o amor é a coisa mais triste quando perdido, e, quando fere, quando machuca, ninguém mais se apruma, ninguém mais se endireita, nem que o gáudio — nem que a alegria, o contentamento — da vingança — quando perde-se um amor & o sentimento torna-se mágoa — conserte o furo, a ferida, que o amor causou.

o amor é tudo & apenas o que não se alcança, porque não se pode compreender plenamente o amor: nenhuma definição existente sobre o amor consegue conter o que seja o amor em sua plenitude: ao amor cabe o imponderável, ao amor cabe o inexplicável.

o amor é o que, às vezes tão próximo, se esfuma & escorre mais depressa do que a espuma com que as ondas tecem sua trança de água & sal.

o amor é a chaga que, sendo fugaz, sendo efêmera, passageira, perdura & nos dói como um mal que não tem cura.

o amor é tudo isso & um pouco mais: o amor não possui forma, fórmula, cheiro, cor, cara, peso, tamanho. por mais bem escrita a definição, não existe definição que comporte todo o matiz, todo o colorido, que o amor carrega, que o mais nobre dos sentimentos agrega.

mas seja o que for o amor, cair, quedar em seu abismo com admirações tamanhas que do amor & seu abismo não se consiga mais sair.

pai, por tudo, por tanto, esta singela homenagem nesta primeira década sem a sua presença física, com você aceso em mim. uma chama que nunca se extinguirá neste peito. não há vento ou tempestade capaz de apagá-la, não há intempérie capaz de miná-la.

chama eterna, como eterno o meu amor por você.

entre mim & meu velho, meu eterno, meu pai,  é tudo amor, e mais coisa nenhuma de que sequer se guarde uma lembrança.

salve o primeiríssimo paulo sabino!
salve a sua existência na minha!

beijo todos!
paulo sabino, o filho.
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(do livro: Essa música. autor: Ivan Junqueira. editora: Rocco.)

 

 

É TUDO AMOR

 

É tudo amor, e mais coisa nenhuma
de que sequer se guarde uma lembrança,
um traço, o fluido passo de uma dança,
uma canção que foge em meio à bruma.
É tudo o que há na ponta de uma lança
que nos fere como áspera verruma
e, quando fere, ninguém mais se apruma,
nem que o conserte o gáudio da vingança.
É tudo e apenas o que não se alcança,
o que, às vezes tão próximo, se esfuma
e escorre mais depressa do que a espuma
com que tecem as ondas sua trança.
É a chaga que, sendo fugaz, perdura
e nos dói como um mal que não tem cura.