A AÇÃO DOS BLACK BLOCS NESTA HORA
10 de setembro de 2013

Caetano Veloso_Black Bloc

Paulo Sabino_Black Bloc

(Nas fotos, o poeta-compositor Caetano Veloso & o poeta Paulo Sabino.)
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Ah, é? Então quer dizer que você SOFREU na ditadura militar, APANHOU, VIU os maiores absurdos?

Ah, é? Então quer dizer que, à época da ditadura militar, você SENTIU dor, REVOLTOU-se, CLAMOU por justiça?

Pois é, mas tudo isso no passado… Todos os verbos (que denotam AÇÃO), aqui, estão no pretérito.

Vamos parar de legitimar o que pensamos HOJE (que é o que REALMENTE importa) com ações do passado.

Ferreira Gullar também LUTOU & SOFREU na ditadura militar & hoje vai aos jornais para dizer que os empresários são, na área econômica, uma espécie de artistas no modo de conduzir o modelo econômico vigente…

Aí me dá uma tristeza imensa… Artistas?! Empresários?! Só se forem do terror, do horror, das recessões econômicas, das mazelas sociais!

O jornalista Marcelo Rubens Paiva escreveu um texto para o jornal “Estadão” no qual legitima a sua postura anti-black blocs apoiado em ações suas que ficaram no passado. Acho isso o fim.

Mobilização social, por conta de violências praticadas pelo Estado, possui uma dose de violência. Isso tem a ver com aquele conhecimento mais antigo que a vovó: gentileza gera gentileza; e violência, obviamente, violência. Não se pode esperar protestos com flores & bandeiras brancas, por parte de toda a massa que vai às ruas, quando muitos são tratados com extrema violência nos seus cotidianos, quando, TODOS, vivemos num Estado ESCROTO & FILHO DA PUTA como o Brasil em diversos aspectos.

O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), como bem escreveu um leitor do texto do Marcelo Rubens Paiva, “com seu pleito por terra (até certo ponto muito justo), invade propriedades privadas levando nas mãos foices e enxadas e, algumas vezes, depredam a propriedade e o plantio ali feito. Isso é legítimo.”

Fico pensando: possivelmente os que bradam, veementes, contra as ações dos black blocs, se moradores do campo, ficariam indignadíssimos com a postura do campesinato ligado aos movimentos sociais em prol de uma distribuição de terras mais igualitária. Portanto, a “depredação” & o “quebra-quebra” incomodam porque acontecem do ladinho das suas confortáveis residências urbanas. É muito mais bacana apoiar a causa do MST ou a dos índios, quando também reagem de forma violenta aos abusos cometidos por grandes latifundiários, porque tais formas de protestos acontecem lááááááá no “fim do mundo”, sem o perigo & a ameaça de que o sangue jorrado respingue nos belos apartamentos da zona sul do Rio de Janeiro.

Escreve, ainda, o leitor que bem responde ao texto do Marcelo Rubens Paiva: “colocar uma máscara não é sinônimo de vandalismo. Nem todos os mascarados são vândalos. Muitos usam máscaras pra se proteger da pimenta, do gás e do FICHAMENTO CLANDESTINO feito por policiais e militares sem identificação e com seus rostos cobertos.”

Sabemos das ações pra lá de ARBITRÁRIAS, seja no campo, seja na cidade, utilizadas pelas milícias do Estado, demasiadamente VIOLENTAS.

Eu quero a paz. Eu prefiro a paz. Sou um homem de delicadezas, portanto, um homem pacífico. Mas acho a indignação extrema extremamente proporcional ao estado de violência gerado pelo Estado.

A cada ação, a sua devida re-ação.

A população é maltratada pelo Estado (ação) & isso, naturalmente, evidentemente, pode gerar, em alguns, uma re-ação na mesma medida.

Beijo todos!
Paulo Sabino.
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(do livro: Poemas escolhidos. autora: Sophia de Mello Breyner Andresen. seleção: Vilma Arêas. editora: Companhia das Letras.)

 

 

NESTA HORA

 

Nesta hora limpa da verdade é preciso dizer a verdade toda
Mesmo aquela que é importante neste dia em que se invoca o povo
Pois é preciso que o povo regresse do seu longo exílio
E lhe seja proposta uma verdade inteira e não meia verdade

Meia verdade é como habitar meio quarto
Ganhar meio salário
Como só ter direito
A metade da vida

O demagogo diz da verdade a metade
E o resto joga com habilidade
Porque pensa que o povo só pensa metade
Porque pensa que o povo não percebe nem sabe

A verdade não é uma especialidade
Para especializados clérigos letrados

Não basta gritar povo é preciso expor
Partir do olhar da mão e da razão
Partir da limpidez do elementar

Como quem parte do sol do mar do ar
Como quem parte da terra onde os homens estão

Para construir o canto do terrestre
— Sob o ausente olhar silente de atenção —

Para construir a festa do terrestre
Na nudez de alegria que nos veste