CRISTIANO MENEZES: POETA DE PRIMEIRA GRANDEZA, PESSOA DE PRIMEIRA LINHA
5 de setembro de 2016

Cristiano Menezes & Paulo Sabino

(Cristiano Menezes & Paulo Sabino)

Cristiano Menezes

Cristiano Menezes_Dedicatória_Guardanapos

(A dedicatória para o meu exemplar de “Guardanapos”, livro de Cristiano Menezes)

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(Cristiano Menezes no projeto “Ocupação Poética”, coordenado por Paulo Sabino)
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Uma notícia tristíssima, que me deixou atônito desde recebida. Desde a notícia, querendo escrever sobre o acontecido, mas cadê palavra para começar? Pela falta, começo pelo início: quinta-feira, primeiro de setembro (01/09/2016), faleceu o querido amigo & grande poeta CRISTIANO MENEZES.

Cristiano Menezes: poeta de primeira grandeza, pessoa de primeira linha.

Eu, desde que conheci o Cristiano Menezes, através de outro grande poeta & querido amigo, Luis Turiba, apaixonei-me de imediato: por sua limpidez de alma, por sua bondade, por sua generosidade, por sua cordialidade, por seu carisma, por sua inteligência. Uma pessoa absolutamente apaixonante por tudo absolutamente. Honra & prazer poder conhecê-lo & trabalhar com o Cris, tê-lo como PARTE VIVA da história do projeto que coordeno, o Ocupação Poética (no dia em que o Cris fez o projeto ao lado do Luis Turiba, 9 de setembro, era aniversário dele & fizemos, no teatro Cândido Mendes, uma grande festa, digna do aniversariante).

Ele internou para operar & um dia antes da operação, falamo-nos. Prometi-lhe uma visita assim que ele deixasse o hospital. Não deu… Um nó na garganta, um choro preso no peito.

A notícia me bateu feito porrada pesada & inesperada. Imagine uma porrada numa situação inimaginável, que de tão inimaginável, de tão inesperada, até agora, não se entende de onde veio o soco. Esta é a sensação que me resta neste momento.

Como homenagem, três poemas do poeta + o vídeo de encerramento da sua noite no projeto que coordeno, o Ocupação Poética, noite linda, onde o Cris comemorou o seu aniversário — que está chegando, 9 de setembro.

Parabéns por tudo, Cris! Saúdo a sua existência!

Poeta de primeira grandeza, pessoa de primeira linha.

Nunca, por mim, os ensinamentos dos seus versos, da sua poética, serão esquecidos: sempre comigo mesmo, pois a jornada que é a vida é de cada um, a jornada que é a vida é intransferível, é inadiável, sem cordão que me proteja (do cordão, só a marca no umbigo), solto no mundo, solto para o próximo passo, livre para saborear os acontecimentos, senhor de mim, senhor dos meus desejos, senhor das minhas vontades, sempre pronto a conhecer, a desvendar, o novo, o inédito, sempre mantendo-me único, ímpar, longe do que se repita, do que seja mera cópia.

Ser genuíno, ser Paulo Sabino, como Cristiano Menezes foi genuinamente Cristiano Menezes.

(E que nunca se apague, que seja perene o endereço da origem do afeto, que nos faz sentir & merecer o calor dos apreços.)

Salve o poeta & amigo!

Tenho certeza de que os deuses & as musas estão em festa por receber poeta do seu quilate & pessoa da sua grandeza.

Saudades imensas, Cris. Sempre.

Saravá!

Beijo todos e, especialmente, o Cris.
Paulo Sabino.
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(do livro: Guardanapos. autor: Cristiano Menezes. editora: 7Letras.)

 

 

COMIGO MESMO

 

Não tenho mais o cordão
dele só a marca no umbigo
com frio no coração
aprendi o calor dos amigos

Podia ter morrido
junto com tudo o que matei
mas nasci atento
pras coisas que ainda não sei

E assim, a cada novo dia,
sempre dono do meu nariz
vivo o medo e a alegria
de quem está sempre por um triz

Na corda bamba é que se vê quem é
o passo adiante é pra quem está solto
lá embaixo a plateia está de pé
aqui no peito o meu mar revolto

O salto é meu
a mão, do companheiro,
e só quando me lanço
é que me sinto inteiro

Agradeço a carona
mas sou filho de mim mesmo
do norte, do sul
da minha vida a esmo

 

 

AOS MEUS FILHOS

 

Quando nascemos
herdamos o que antes foi feito
línguas canções
ritmos comidas
roupas jeitos

São signos que ficam
porque significam
pontos que se tecem
elos que se multiplicam

E que de nó em nó
haja sempre o novo
de Colombos destemidos
a descobrir o além
dos horizontes presumidos

Este é o desafio
da meada que nos compete
viver a inédita experiência que somos
manter-nos únicos
longe do que se repete

Mas na memória
esteja sempre o cais
de onde partimos
eterno porto
que não veremos jamais

E que nunca se apague
seja o perene endereço
a origem do afeto
que nos faz sentir e merecer
o calor dos apreços

 

 

CURRICULUM VITAE

 

Ginásio no São Bento
e Zé Bonifácio
clássico no Santo Inácio
o que não foi fácil
Cheguei a estudar Direito
mas saí errando por aí…
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(do site: Youtube. projeto: Ocupação Poética [2ª edição] — Teatro Cândido Mendes. local: Rio de Janeiro. data: 09/09/2015. Encerramento da noite, por Paulo Sabino, e o Parabéns pra você ao poeta aniversariante Cristiano Menezes.)

AS BORBOLETAS
24 de setembro de 2014

Borboletas

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Eu vou lhe dar de presente uma coisa.
É assim: borboleta é pétala que voa.

(Clarice Lispector)

 

primavera: segundo o dicionário houaiss: “estação temperada e amena, entre o inverno e o verão. [No hemisfério sul, estende-se do equinócio de setembro (22) ao solstício de dezembro (20); no hemisfério norte, do equinócio de março (21) ao solstício de junho (20).]”

primavera: estação considerada a estação das flores, representante do renascimento, da transformação.

a estação das flores é a estação das borboletas.

borboletas: segundo o dicionário aurélio: “designação comum aos insetos lepidópteros diurnos, cujas antenas são clavadas. As larvas das borboletas não tecem casulos, passando o período ninfal sob forma de crisálidas.”

borboletas: insetos diurnos que se alimentam principalmente do néctar das flores & cujo desenvolvimento se caracteriza por quatro fases: o ovo, a lagarta, a pupa (quando em transformação, em metamorfose, dentro da crisálida) & a fase adulta (já borboleta).

sendo o néctar das flores um dos principais alimentos das borboletas, a primavera, estação que se inicia, estação considerada a estação das flores, é, também, a estação das borboletas, bichinhos que, além de flores, gostam do dia.

brancas, azuis, amarelas & pretas: uma profusão de cores soltas no ar: brincam, na luz do dia, as belas borboletas.

soltas no ar, delicadas, levíssimas, qual pétalas a voar, brincam as borboletas, que se misturam, se embaralham, se desordenam, em cores as mais diversas: brancas, azuis, amarelas & pretas.

enquanto brincam, na luz, as belas borboletas, brancas, azuis, amarelas & pretas, a poesia trata de lhes dar as rimas fantásticas, rimas lúdicas, como a brincadeira das borboletas à luz do dia, para que elas sofram mais uma metamorfose, para que elas se transformem em pura lírica:

borboletas brancas são alegres & francas.

borboletas azuis gostam muito de luz.

as amarelinhas são tão bonitinhas!

e as pretas, então… que escuridão!

enquanto brinca de rima a poesia, metamorfoseando borboletas em pura lírica, brincam, na luz, as belas borboletas: brancas, azuis, amarelas & pretas.

primavera: estação considerada a estação das flores, representante do renascimento, da transformação.

borboleta: pétala que voa.

que a estação que se inicia (in)vente a todos as belezas que lhe são caras, as belezas que lhe são estimadas, as belezas que reflitam a sua cara, que reflitam o seu rosto: que belas borboletas — brancas, azuis, amarelas & pretas — brinquem à luz do olhar de cada um nesta primavera.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do site: Vinicius de Moraes — Oficial. autor: Vinicius de Moraes.)

 

 

AS BORBOLETAS

 

Brancas
Azuis
Amarelas
E pretas
Brincam
Na luz
As belas
Borboletas.

Borboletas brancas
São alegres e francas.

Borboletas azuis
Gostam muito de luz.

As amarelinhas
São tão bonitinhas!

E as pretas, então…
Oh, que escuridão!
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(do site: Youtube. áudio extraído do álbum: Partimpim Dois. artista & intérprete: Adriana Calcanhotto. canção: As borboletas. poema: Vinicius de Moraes. música: Cid Campos. gravadora: Sony-BMG.)

TRANS
26 de agosto de 2014

Salgado Maranhão_O mapa da tribo_Capa

(Na foto, a capa do mais novo livro de Salgado Maranhão, “O mapa da tribo”. No meu exemplar, a dedicatória: “Para Paulo Sabino, que vive, sonha e respira poesia. Salgado Maranhão”.)
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trans: prefixo de origem latina que pode significar “através de”, “para além de”, e que engloba, entre outras, a acepção de “mudança”, de “trans-formação”, de “trans-mutação”.

trans: “através de” signos, “através de” determinados símbolos, as mudanças, as trans-formações, as trans-mutações, que operamos caminho afora.

estou grudado à pele, estou colado na superfície, destes signos que me adestram pela noite imêmore, pela noite esquecida, tantas as “noites-trans”, noites de trans-formações, noites de trans-mutações, através dos signos que me adestram.

os signos, os símbolos, que me adestram, que me condicionam, que me habilitam, que me capacitam, pela noite imêmore, esquecida (tantas as “noites-trans”): as palavras, unidades lingüísticas sem as quais não conseguiríamos sobreviver, pois, com elas, organizamos & ordenamos as coisas do mundo para que possamos nele “existir”. o mundo, sem tal ordenamento, sem tais signos, não passaria de um grande caos.

os signos, os símbolos, que me adestram, que me condicionam, que me habilitam, que me capacitam, pela noite imêmore, esquecida (tantas as “noites-trans”): as palavras, matéria do trabalho que realizo através da poesia.

por eles, pelos signos, através deles, me relâmpago, me acendo clarão intenso entre matilhas, me acendo clarão intenso entre agrupamentos ordinários, de pouco valor.

neles, nos signos, através deles, teci minhas ráfias, tramei minhas misérias de luz & sombra (estão nas palavras, na poesia, as minhas dores & as minhas alegrias, os meus dissabores & os meus fascínios).

deles, dos signos, são meus labirintos de safira, dos signos — isto é: das palavras — são meus enredamentos de safira, deles — dos signos — são meus emaranhados de caminhos nos quais me perco, emaranhados de caminhos feitos da pedra preciosa de coloração azul, cor linda & fria.

um dia, uma fênix grafou meu nome em suas asas (fênix: ave lendária, única de sua espécie, e que, por conseguinte, não pode reproduzir-se como todos os outros animais. quando percebe aproximar-se o fim da sua existência, deixa-se arder em um braseiro para, em seguida, renascer das próprias cinzas).

desde então, desde que uma fênix grafou meu nome em suas asas, me encanto (me delicio, me deslumbro, me seduzo, me enfeitiço) apenas, somente, para renascer:

desde então, desde que uma fênix grafou meu nome em suas asas, me en/canto em canto — de poesia — a/penas, a custo das minhas penas & aflições, para renascer:

trans-bordante em cada mim, indo “para além de” cada mim, ultrapassando a minha própria borda:

trans-bordante em cada mim: derramado, entornado, excedido, em cada paulo sabino que renasce “através de” trans-formações, “através de” trans-mutações, que operamos caminho afora.

(trans: prefixo de origem latina que pode significar “através de”, “para além de”, e que engloba, entre outras, a acepção de “mudança”, de “trans-formação”, de “trans-mutação”.)

os signos, os símbolos, que me adestram, que me condicionam, que me habilitam, que me capacitam: as palavras, matéria do trabalho que realizo através da poesia, com quem me relâmpago, com quem me acendo clarão intenso.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: O mapa da tribo. autor: Salgado Maranhão. editora: 7Letras.)

 

 

TRANS

 

Estou grudado à pele
destes signos
………………….que me adestram
pela noite imêmore.

Por eles me relâmpago
entre matilhas; neles
teci minhas ráfias de luz
…………………………………..e sombra; deles
são meus labirintos de safira.

Um dia uma fênix
grafou meu nome
…………………………em suas asas;
desde então me encanto
……………………………………(apenas)
para renascer:

transbordante de mim.

NUVENS
15 de julho de 2014

Nuvens

Nuvens & Cadeia de montanhas

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Céu, tão grande é o céu
E bandos de nuvens que passam ligeiras
Pra onde elas vão, ah, eu não sei, não sei

(Canção: Dindi. Versos: Aloysio de Oliveira. Música: Tom Jobim.)

 

 

eu sempre fui um admirador de muitas coisas da natureza.

o mar é o meu amante maior, é a coisa que mais me fascina, que mais prende a minha atenção.

uma outra coisa que me fascina é árvore, ser carregado de folhas & dramaticidade. suas ramificações & galhos, juntamente com as suas folhas, dispõem-se aos meus olhos como braços & mãos em poses dramáticas, em poses teatrais.

coisa também que me fascina é pedra, sua constituição maciça, inteiriça, inerte, inanimada, silenciosa, parada no tempo, pregada ao chão.

e, por fim, coisa também fascinante, que é o inversamente proporcional às pedras, é nuvem.

pelo motivo inverso ao das pedras (sua constituição maciça, inteiriça, inerte, inanimada, silenciosa, parada no tempo, pregada ao chão), eu adoro olhar nuvens. desde muito novo.

para descrever as nuvens, eu necessitaria ser muito rápido — numa fração de segundo, deixam de ser as que são, tornam-se outras.

é próprio delas não se repetir nunca nas formas, matizes, poses & composição.

sem o peso de nenhuma lembrança, as nuvens flutuam, sem esforço, sobre os fatos mundanos.

elas — as nuvens — lá podem ser testemunhas de alguma coisa?

logo se dispersam para todos os lados.

comparada com as nuvens, passageiras & ligeiras & mutáveis por demais, a vida, que também é passageira & ligeira & mutável por demais, parece muito sólida, parece quase perene, quase ininterrupta, praticamente eterna.

perante as nuvens, até a pedra parece uma irmã em quem se pode confiar, devido à sua constituição maciça, inteiriça, inerte, inanimada, silenciosa, parada no tempo, pregada ao chão.

já elas, as nuvens — são primas distantes & inconstantes.

(é próprio delas não se repetir nunca nas formas, matizes, poses & composição.)

que as pessoas vivam, se quiserem, e, em seqüência, que cada uma, que cada pessoa, morra: as nuvens nada têm a ver com toda essa coisa muito estranha a que chamamos: existência.

sobre a tua vida inteira, caro leitor, e sobre a minha vida, ainda incompleta, elas, as nuvens, passam pomposas, como sempre passaram.

as nuvens não têm obrigação de conosco findar.

as nuvens não precisam ser vistas para navegar.

nuvens: é próprio delas não se repetir nunca nas formas, matizes, poses & composição. sem o peso de nenhuma lembrança, as nuvens flutuam, sem esforço, sobre os fatos mundanos.

pelo motivo inverso ao das pedras (sua constituição maciça, inteiriça, inerte, inanimada, silenciosa, parada no tempo, pregada ao chão), eu adoro olhar nuvens (numa fração de segundo, deixam de ser as que são, tornam-se outras). desde muito novo.

a cabeça nas nuvens, os olhos no céu: a tentativa, em solo, dos mais altos vôos.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Poemas. autora: Wislawa Szymborska. seleção & tradução: Regina Przybycien. editora: Companhia das Letras.)

 

 

NUVENS

 

Para descrever as nuvens
eu necessitaria ser muito rápida —
numa fração de segundo
deixam de ser estas, tornam-se outras.

É próprio delas
não se repetir nunca
nas formas, matizes, poses e composição.

Sem o peso de nenhuma lembrança
flutuam sem esforço sobre os fatos.

Elas lá podem ser testemunhas de alguma coisa —
logo se dispersam para todos os lados.

Comparada com as nuvens
a vida parece muito sólida,
quase perene, praticamente eterna.

Perante as nuvens
até a pedra parece uma irmã
em quem se pode confiar,
já elas — são primas distantes e inconstantes.

Que as pessoas vivam, se quiserem,
e em sequência que cada uma morra,
as nuvens nada têm a ver
com toda essa coisa
muito estranha.

Sobre a tua vida inteira
e a minha, ainda incompleta,
elas passam pomposas como sempre passaram.

Não têm obrigação de conosco findar.
Não precisam ser vistas para navegar.

COBRA RASTEIRA
19 de fevereiro de 2014

Cobra

 

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nem todo trajeto é reto, nem o mar é regular…

estrada: caminho torto.

estrada: caminho repleto de curvas, desvios, buracos & pedras.

estrada: caminho torto: me perco pra encontrar, pois nem todo trajeto é reto, nem o mar é regular…

me perco pra encontrar (a trilha que trilho), abrindo talho na vida, construindo possibilidades, até que eu possa passar.

sigo como um moinho que roda, traçando a linha sem fim (o caminho que me cabe), traçando o meu fio-condutor, e desbravando o futuro, futuro girando em volta de mim, aguardando, no seu tempo, que eu trilhe o meu caminhar a fim de alcançá-lo.

correndo o mundo, eu, cobra rasteira, bicho que avança tortuoso (pois nem todo trajeto é reto, nem o mar é regular), eu, cobra rasteira, animal que vive rente ao chão, rente à vida terrena, eu, cobra rasteira, me engoli de vez (como na lenda africana, oxumaré, a “cobra arco-íris”, orixá símbolo da mobilidade, do movimento, cobra que morde a própria cauda, simbolizando, com isso, o seu renascimento, as tantas metamorfoses que sofremos ao longo do percurso).

ê “giramundo”! ê “roda-vida”! assim o chão se fez, assim se fez o caminhar, através das voltas que o mundo dá, dos passos que imprimimos nele & das transformações que imprimimos em nós.

afinal, nem todo trajeto é reto, nem o mar é regular.

sinuosos pela vida, feito cobra rasteira, avante!

beijo todos!
paulo sabino.
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(autor: Kiko Dinucci.)

 

 

COBRA RASTEIRA

 

Nem todo trajeto é reto
Nem o mar é regular

Estrada, caminho torto
Me perco pra encontrar
Abrindo talho na vida
Até que eu possa passar
Como um moinho que roda
Traçando a linha sem fim
E desbravando o futuro
Girando em volta de mim

Correndo o mundo
(Cobra rasteira)
Me engoli de vez
(Cobra rasteira)
Ô, giramundo
(Cobra rasteira)
Assim o chão se fez

Nem todo trajeto é reto
Nem o mar é regular
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(do site: Youtube. áudio extraído do cd: MetaL MetaL. selo: Desmonta. canção: Cobra rasteira. artista: Metá Metá. autor da canção: Kiko Dinucci.)

O QUE É BONITO?
29 de janeiro de 2014

Pedras do Arpoador_Rio de Janeiro

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o que é bonito?

bonito é o que persegue o infinito, bonito é o que persegue aquilo que não tem limites, bonito é o que persegue uma grandeza cujos valores não são limitados, bonito é o que persegue o incalculável, o imensurável.

a beleza é coisa que se pretende grandiosa & eloqüente. a beleza, por seu caráter de encantamento, admiração ou prazer através dos sentidos, quer durar, quer ficar para sempre, não quer passar.

mas eu não sou. eu não sou infinito, muito pelo contrário: o dia, um dia, dá cabo; um dia, acabo; um dia, adeus.

por isso (por ser finito, por ter limites, por não ser grandioso), eu gosto do inacabado, do imperfeito.

eu quero o estragado, o vencido, o danificado, eu quero o que “dançou”, o que não se saiu bem, o que se saiu mal.

eu quero mais erosão, mais desgaste, mais corrosão, quero, cada vez mais, ser consumido pelo tempo, e menos granito — menos rocha, menos dureza, menos resistência.

quero estar apto a mudanças, a transformações, na consumação do tempo.

eu quero namorar o zero, que é o início de tudo, que é o ponto de partida para qualquer coisa. eu quero namorar o zero porque desejo estar apto a mudanças, apto a transformações: desejo aptidão para recomeçar sempre que preciso for.

eu quero namorar o “não”, que é impedimento, que é negativa, que é recusa, porque a vida é feita de perdas, a vida é feita de impossibilidades, a vida é feita de frustrações, e eu, como participante do mundo, sei que não escaparei dos “nãos” a mim reservados.

eu quero escrever o que desprezo, para que nunca me falte a noção dos meus muitos limites & das minhas muitas incapacidades, para que não me cresça, nunca!, o rei na barriga & sua arrogância aristocrática.

eu quero desprezar o que acredito a fim de poder acreditar em diversas outras coisas caminho afora, eu quero desprezar o que acredito para que eu conserve, em mim, o eterno aprendiz, conserve, em mim, aquele capaz de aprender com o que a vida ofertar de vivências.

o que nos impulsiona à vida é o desconhecido, o que nos lança à vida são os não-saberes. se de tudo soubéssemos, se tivéssemos as chaves de acesso ao mundo, a vida seria um caminhar chato, de estrada previamente delineada.

eu não quero a gravação — coisa que está aí, já feita, já editada, já devidamente guardada. eu quero o grito — o que ainda vai ser lançado, o que está por vir, o que está em processo de construção: é que a gente vai (afinal, um dia, acabo, um dia, adeus) & fica a obra (a gravação, coisa que está aí, já feita, já editada, já devidamente guardada), e eu persigo o que falta (o que ainda vai ser lançado, o que está por vir, o que está em processo de construção: o grito), não o que sobra (a obra).

eu quero tudo que dá & passa — tudo que estraga, tudo que perece, tudo que se desgasta, tudo que se deteriora.

eu quero tudo que despe, se despede, e despedaça: quero tudo que é feito nós, seres humanos, tudo que é feito de nós.

eu quero a vida que me cabe no seu breve tempo de sonhar & amar.

beijo todos!
paulo sabino.
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(autores: Braulio Tavares / Lenine.)

 

 

O QUE É BONITO?

 

O que é bonito?
É o que persegue o infinito
Mas eu não sou
Eu gosto do inacabado
Do imperfeito, o estragado
O que dançou
Eu quero mais erosão
Menos granito
Namorar o zero e o não
Escrever o que desprezo
E desprezar o que acredito
Eu não quero a gravação
Eu quero o grito
É que a gente vai
E fica a obra
Mas eu persigo o que falta
Não o que sobra
Eu quero tudo que dá e passa
Quero tudo que se despe
Se despede
E despedaça
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(do site: Youtube. áudio extraído do cd: Olho de peixe. artistas: Lenine / Marcos Suzano. canção: O que é bonito? intérprete: Lenine. autores da canção: Braulio Tavares / Lenine. gravadora: Velas.)

A POESIA É UM ATENTADO CELESTE
6 de novembro de 2013

Banco vazio com folhas secas

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senhores,

há pouco, passei por dois acidentes graves, em seqüência, cada qual com suas peculiaridades.

num acidente, eu vi a cara da morte, e ela estava viva: voltando de belo horizonte para o rio de janeiro, o ônibus em que viajava bateu na traseira de um caminhão parado no acostamento. uma pessoa morreu na hora, três outras ficaram presas nas ferragens, e não sei quantos mais feridos. por sorte, tive apenas um inchaço no polegar direito & dores nas costas devido à batida. nada mais.

no outro acidente, a dor de ser fisicamente freado pela vida: pedalando com o orlando (meu camelo azul da cor do mar), um ciclista, que vinha na direção oposta à minha, ao tentar ultrapassagem, invadiu a contramão (sem que eu tivesse tempo de desviar) & bateu de frente comigo. resultado: por causa do deslocamento de uma parte óssea (curiosamente chamada “capitulo”) & da fratura de um outro osso, tudo no cotovelo esquerdo, tive de operar, para colocar pinos & parafusos, e de imobilizar o braço. um mês imobilizado & depois — pelo menos — mais um mês de fisioterapia.

estou ótimo, graças. por sorte, não foi o braço direito o atingido, afinal sou destro!

no entanto, querendo ou não, a vida me parou, me pôs quieto no meu canto. com isso, tive de encará-la sem meias verdades.

tais acontecimentos mexem, mexeram, comigo. fichas caíram. prioridades subiram.

re-pensar, re-ver, re-fazer, re-tomar.

tenho que um monte de coisas pendentes, e importantíssimas.

momento de reflexão: dando um tempo para mim. ausente de mim mesmo.

eu estou ausente, porém, no fundo desta ausência, existe a espera de mim mesmo, e esta espera é um outro modo de presença (tenho que um monte de coisas pendentes, e importantíssimas).

à espera de meu retorno, eu estou em outros objetos. ando em viagem (interna) dando um pouco de minha vida a certos livros & a certos discos, objetos que me esperaram muitos anos.

eu não estou & estou: estou ausente & estou presente, mas presente “em estado de espera”.

eles (os objetos a quem dou um pouco de minha vida) queriam minha linguagem para expressar-se. e eu queria a — linguagem — deles para expressá-los: eis o atroz equívoco: o equívoco primordial: a tentativa de interpretação das coisas, herméticas nelas mesmas, sem explicações ou justificativas sobre o que são & desejam.

angustioso, lamentável (pelo atroz equívoco), vou-me adentrando nestes objetos — e deixando minhas roupas, perdendo as carnes: meu esqueleto vai-se revestindo do material que forma os objetos.

estou-me fazendo livros, discos, palavras, som…

(quantas vezes me converti em outras coisas…)

o processo de transformação, por me achar à espera de mim mesmo, é doloroso & cheio de ternura. podia dar um grito, fazer barulho, chamar a atenção às dores das mudanças.

mas para quê?

à transubstanciação (transformação de uma substância em outra) de nada adiantaria o grito.

com o grito, a transubstanciação se espantaria.

(a transubstanciação: a transformação de uma substância, o paulo sabino, em outra.)

há que guardar silêncio. a fim de pensar, refletir, concentrar.

esperar em silêncio.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Pescados vivos. autor: Vicente Huidobro. tradução: Waly Salomão. editora: Rocco.)

 

 

A POESIA É UM ATENTADO CELESTE

 

Eu estou ausente porém no fundo desta ausência
Existe a espera de mim mesmo
E esta espera é outro modo de presença
À espera de meu retorno
Eu estou em outros objetos
Ando em viagem dando um pouco de minha vida
A certas árvores e a certas pedras
Que me esperaram muitos anos

Cansaram-se de esperar-me e sentaram-se

Eu não estou e estou
Estou ausente e estou presente em estado de espera
Eles queriam minha linguagem para expressar-se
E eu queria a deles para expressá-los
Eis aqui o equívoco o atroz equívoco

Angustioso lamentável
Vou-me adentrando nestas plantas
Vou deixando minhas roupas
Vou perdendo as carnes
E meu esqueleto vai-se revestindo de cascas
Estou-me fazendo árvore  Quantas vezes me converti em
………………………………………………………….[outras coisas…
É doloroso e cheio de ternura
Podia dar um grito porém a transubstanciação se espantaria
Há que guardar silêncio  Esperar em silêncio

CANTO MANEIRO
4 de junho de 2013

Rio do Braço

(O ser do rio: nunca nos banhamos no mesmo rio…)
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eis, aqui, o canto maneiro, aqui, um modo de cantar bacana:

eu canto à maneira índia. eu canto à maneira negra. eu canto à maneira grega. eu canto à maneira gregoriana.

eis, aqui, o canto maneiro: todas as maneiras do cantar cabem no meu canto. todas as vozes a minha garganta abriga. porque belezas são complementares, não excludentes. e porque o que é belo ganha mais, fica melhor, porque existe o diferente. o mundo nos estampa isso a toda hora: a quantidade de formas & cores & elementos & texturas da natureza mostra que a beleza — num sentido mais amplo — está na diversidade.

eu canto de todas as maneiras (índia negra grega gregoriana): eis o canto maneiro: todas as vozes a minha voz abriga.

eu canto à maneira de heráclito: o fogo, o transe, a transmigração.

eu canto à maneira de heráclito: o ser do rio — nunca nos banhamos no mesmo rio.

heráclito: filósofo pré-socrático; parte do princípio de que tudo está em movimento, nada pode permanecer estático — tudo se move, tudo se movimenta, exceto o próprio movimento (heráclito é considerado por muitos o pai da “dialética”). heráclito cria no princípio do devir incessante, acreditava no princípio da transformação constante das coisas. aqui, um seu fragmento célebre: “não é possível entrar duas vezes no mesmo rio, nem tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado; graças à velocidade do movimento, tudo se dispersa  e se recompõe novamente, tudo vem e vai”. o filósofo pré-socrático atribuía a um elemento a responsabilidade da existência de todas as coisas mundanas em mudança: o fogo.

fogo: elemento que ilumina, que tira as coisas da escuridão, elemento que aquece.

somos como o rio: nunca as mesmas águas, sempre outras a passar. nunca somos os mesmos, vamos nos modificando com o passar do tempo (nascimento, infância, pré-adolescência, adolescência, as idades adultas & velhice), sempre metamorfoses ambulantes, sempre na transmigração, na alteração de domicílio — um dia, descobrimos que a “casa” que nos abriga não nos serve mais & precisamos abandoná-la por outra que nos dê a devida guarida, por outra que nos dê a devida acolhida.

o ser do rio: nunca nos banhamos no mesmo rio (nunca as mesmas águas, sempre outras a passar, o rio está em contínuo fluir)…

eu canto à maneira eletrônica, eu canto ao modo moderno de cantar, eu canto para o que é criação da inteligência humana, eu canto para a ciência, eu canto para os avanços tecnológicos & científicos que podem  melhorar a qualidade das nossas vidas.

eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira índia, negra, grega, gregoriana: cantar a todas as maneiras de cantar.

eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira de heráclito: o fogo, o transe, a transmigração, o ser do rio (nunca nos banhamos no mesmo rio…).

eis, aqui, o canto maneiro: cantar à maneira eletrônica, utilizar-se de tudo que no mundo está, seja velho, seja novo, seja o que for, a fim de cantar, e cantar bem, cantar com a voz emocionada, para que tudo o que é cantado exista em sintonia com o bem-estar do mundo, para que tudo o que é cantado esteja afinado com o bom da vida. tudo dentro do tom.

o canto maneiro: o canto que abriga, que acolhe, que oferece morada.

beijo todos!
paulo sabino.
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(do encarte do cd: Mulheres de Péricles. artista: Vários. autor dos versos. Péricles Cavalcanti. selo: Joia Moderna.)

 

 

CANTO MANEIRO

 

Eu canto à maneira índia
Negra, grega, gregoriana
Eu canto à maneira de Heráclito
O fogo, o transe, a transmigração
O ser do rio
Nunca nos banhamos no mesmo rio
Eu canto à maneira eletrônica
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(do site: Youtube. áudio extraído do álbum: Mulheres de Péricles. artista: Vários. canção: Canto maneiro. autor da canção: Péricles Cavalcanti. intérprete: Juliana Perdigão. selo: Joia Moderna.)

ETERNO APRENDIZ: MUDA
9 de maio de 2013

Muda

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a gente muda.

(tudo muda, o tempo todo, no mundo.)

a gente muda, a gente se transforma, a gente se modifica, com o passar do tempo.

o paulo sabino de hoje, com 36 anos, não é o mesmo paulo sabino com 26 anos, que também não foi o mesmo paulo sabino com 16 anos, que também não foi o mesmo com 6 anos, e que também não será o mesmo com 46, ou 56, ou 66 anos.

as mudanças são inerentes à existência.

(tudo muda, o tempo todo, no mundo.)

a gente muda, a gente se transforma, a gente se modifica, com o passar do tempo.

e a gente, além de mudar, a gente, muda. a gente, além de mudar, a gente, sempre, muda.

muda: segundo o dicionário houaiss, “planta no início de sua evolução”.

nós, gente, nós, seres humanos, somos seres, por mais crescidos & adultos, sempre muito pequenos frente ao universo que nos abriga & que — justamente por nossa pequenez frente à grandiosidade do universo — desconhecemos desde sempre, numa ignorância atávica. essa ignorância, atávica, devido à nossa pequenez frente ao universo imensurável, nos leva a errâncias, nos leva a caminhos incertos, nos leva a caminhos duvidosos, nos leva a caminhos sujeitos a mudanças.

frente à grandeza do mundo, não passamos de mudas, frente à grandeza do mundo, não passamos de plantas pequeninas, frente à grandeza do mundo, não passamos de plantas nanicas: nunca, a gente, ramagem encorpada, nunca, a gente, árvore aprontada, nunca, a gente, frondosa na estrada: sujeitos a errâncias, sujeitos a mudanças, por conta da nossa pequenez frente ao universo imensurável: seres inacabados, inconstantes, incoerentes, incompletos.

(é justamente essa incompletude que nos impulsiona à vida, que nos impulsiona a descobertas.)

a gente muda muda muda, sempre muda, sempre se transforma, sempre se transmuta, e sempre planta pequenina, e sempre planta nanica, frente à grandeza do universo que nos abriga.

a gente muda muda muda, e parte, e vai embora, e deixa muita coisa pela estrada.

(é justamente esse movimento, o de partir, o de ir embora, o de quebrar, o de romper consigo, que faz com que o paulo sabino de hoje, com 36 anos, não seja o mesmo paulo sabino com 26 anos, que também não foi o mesmo paulo sabino com 16 anos, que também não foi o mesmo com 6 anos, e que também não será o mesmo com 46, ou 56, ou 66 anos.)

porém contudo entretanto todavia, ao mesmo tempo em que a gente parte, ao mesmo tempo em que a gente vai embora, ao mesmo tempo em que a gente se deixa, parte de nós, na estrada, perdura, parte de nós, na estrada, permanece, parte de nós não parte na estrada: só o que nos interessa, só o que nos importa, continua.

a gente muda muda muda & parte, vai embora, deixa um tanto da gente — não tudo da gente — no meio da estrada. o que a gente não larga, o que a gente não abandona, perdura (sabe-se deus até quando…).

a gente: sempre muda: a gente: sempre planta pequena, nanica, sempre planta em desenvolvimento, nunca árvore aprontada.

(e que bom: é justamente essa incompletude que nos impulsiona à vida, que nos impulsiona a descobertas.)

sigamos eternos aprendizes da vida.

(tudo muda, o tempo todo, no mundo.)

beijo todos!
paulo sabino.
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(autor: Paulo Sabino.)

 

a gente muda muda muda
sempre muda

nunca ramagem encorpada
nunca árvore aprontada
nunca frondosa na estrada

muda muda muda
e parte
perdura

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(Para Ana Paula Mattos.)

ANTIMÉTODO
3 de abril de 2013

Estante anti-método

(Na foto, a estante que é, em si, o próprio antimétodo.)
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para mim não existe método à leitura dos livros de poesia. (e à de quaisquer outros.)
 
não existe método à publicação dos poemas neste espaço.
 
a leitura de poesias, as publicações deste espaço, se dão de forma caótica.
 
não há método para leituras, publicações, audições de música: tudo se dá de forma desordenada, tudo se dá de forma desorientada.
 
assim, vidafora, desoriento-me sem qualquer método ou sem qualquer fim (sem qualquer finalidade, sem pragmatismos).
 
desorientando-me sem qualquer método, pode-se dizer que o “antimétodo” é o método de vida escolhido.
 
a orientação: seguir a desorientação.
 
o método: seguir o antimétodo. 
 
vou & não vou, mas vou: na desorientação seguida, na total falta de método, transformações ocorrem: durante o percurso, parte do ser vai, parte do ser não vai, mas o ser — o todo — vai, o ser continua sua caminhada. o ser segue sua sina.
 
vou & não vou, mas vou: caio sem alardes. o que tiver de tombar, o que tiver de cair, o que tiver de despencar, do ser, caia, tombe, despenque, do ser, sem alardes. parte natural do processo: deixar, ao longo da caminho, cair as máscaras que não servem mais enquanto outras novas são forjadas.
 
(caio sem alardes: aquele que se propõe ao antimétodo bem sabe da existência dos riscos de quem se põe ao sabor das errâncias.)
 
o que é & não é: mas é: o ser: eu sou & não sou, tudo ao mesmo tempo já, desordenado, desorientado, contraditório, múltiplo: di-verso.
 
o que é & não é: mas é: o ser: “desorientar-me” é meu método.
 
desoriento-me sem qualquer método: pois “desorientar-me” é a regra, “desorientar-me” é minha escolha, meu método.
 
pouco a pouco, embaralho tudo & nada (assuntos, livros, filmes, discos, os mais diversificados).
 
(vou & não vou, mas vou. o que é & não é: mas é.)
 
sou meu próprio espantalho: fujo de mim mesmo. finjo-me da minha própria esfinge (sempre um enigma): algo de mim me escapa, algo de mim desconheço, algo de mim não alcanço. 
 
(eu prefiro ser esta metamorfose ambulante do que ter a mesma velha opinião formada sobre tudo: sobre, inclusive, o que eu “nem sei quem sou”…)
 
perdido em meu labirinto, sou o que sou (será o paulo sabino a imagem que o paulo sabino tem de si, perdido em seu próprio labirinto?) ou minto (para mim)?…
 
sou o que sou ou a imagem que projeto de mim é falha? será isso uma regra secreta, uma regra escondida até de mim mesmo (projetar uma imagem equivocada de mim)?
 
afinal, sem qualquer fim (sem qualquer finalidade, sem pragmatismos), desoriento-me sem qualquer método: “desorientar-me” é meu método.
 
ser humano: incompleto, inconstante, inacabado, imperfeito: ser em permanente construção: ser humano: lugar de passagem: ponte entre o que vai fora & o que vai dentro do ser.
 
(vou & não vou, mas vou: o que é & não é: mas é: eu prefiro ser esta metamorfose ambulante. sempre sempre sempre.)
 
beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Ciranda da poesia — Sebastião Uchoa Leite por Franklin Alves Dassie. autor dos poemas: Sebastião Uchoa Leite. editora: EdUERJ.)
 
 
 
ANTIMÉTODO
 
 
Desoriento-me
Sem qualquer
Método
Ou sem
Qualquer fim
Vou e não vou
Mas vou
Caio sem qualquer
Alarde
O que é
E não é: mas é
Desorientar-me
É meu método
 
 
 
ANTIMÉTODO 2
 
 
Pouco a pouco
Embaralho tudo e nada
Sou meu próprio
Espantalho
Fujo
De mim mesmo
Finjo-me
Da minha própria
Esfinge
Perdido em meu próprio
Labirinto
Sou o que sou
Ou minto? Será isso
Uma regra secreta?