o rinoceronte — bicho grande, forte, imponente, e: exato. exato em suas linhas, exato em suas formas, exato em suas funções.
o poeta, ao contrário do rinoceronte — inexato, com os seus sobejos & sua escassez, com o seu corpo perdido pelos cantos das palavras alojadas. ainda que precário, ainda que inexato, o vate pode apropriar-se da voz anginosa do rinoceronte. pode, exatamente por sua indefinição, também ser definido: rinoceronte. o poeta consegue suas formas pela multidão exatamente por sua posição disforme; ele pode ser tudo por ser exatamente: nada (ou quase).
o corpo do poeta: disforme, angaria faltas & excessos por onde anda — um guindaste se apropria do sexo do poeta, o chifre lhe cresce pelo nariz, o queixo começa a se empinar, o bardo guincha o que nunca escutou: a voz do rinoceronte.
o poeta & a sua voz — que é a poesia — podem transfigurar-se em tudo & qualquer coisa.
na voz do poema cabem quaisquer vozes, inclusive a voz anginosa, voz dolorosa, de um rinocerante.
(salve a arte poética!)
beijo todos!
paulo sabino.
__________________________________________________________________________
(extraído do blog: Acontecimentos / http://antoniocicero.blogspot.com. blog de: Antonio Cicero. autor da poesia: Alberto Pucheu.)
(poesia contida no livro: A fronteira desguarnecida — poesia reunida 1993 – 2007. editora: Azougue.)
POEMA UNGULADO Nº 2
Nenhuma gordura empanturra o corpo
do rinoceronte, varando suas cercas.
Nenhum couro escorrega em torno
da carne. Nenhuma dúvida quanto
a seu peso, quanto à coragem
ou a sua tranqüilidade. A armadura
talhada nos músculos, os chifres,
o rabo espanando qualquer súplica.
Olhos para ver. Boca para comer.
Patas para pisar. Orelhas para ouvir.
O corpo… na medida exata do corpo.
E o meu, tão distante, perdido pela multidão, pelos cantos das
palavras alojadas, angaria faltas e excessos por onde anda: um
guindaste se apropria de meu sexo, o combustível escasso para mais
alguns quilômetros, o chifre crescendo pelo nariz. Quando o queixo
começa a se empinar, guincho o que nunca escutei: a voz anginosa
do rinoceronte.
Salve a arte poética e tua alegria sempre!!!
beijos.
carmen.
Salve a arte poética!
Beijo, querida!