(Paulo Sabino & seu epigrama: avançar, sempre, com o presente que se desembrulha nas mãos.)
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epigrama: consta no dicionário houaiss: “entre os antigos gregos, qualquer inscrição, em prosa ou verso, colocada em monumento, estátuas, moedas etc., dedicada à lembrança de um evento memorável, uma vida exemplar etc.”
epigrama:
bom é ser árvore, vento, e sua grandeza inconsciente: não pensar, não temer; apenas: “ser”.
e, assim sendo (árvore, vento, e sua grandeza inconsciente), temer coisa alguma, ser “altamente”. “altamente” porque o único compromisso de vida num caso como esse — o de viver sendo como árvore & vento, dentro das suas grandezas inconscientes — é viver sem se preocupar em como, até quando, ou por quê.
bom é ser árvore, vento: ser, apenas: altamente.
permanecer uno, íntegro, inteiriço, permanecer sem se pensar em partes, fragmentos, pedaços, olho boca cérebro rim coração, permanecer sem se pensar como tipo, modelo, categoria, permanecer uno, sempre só, alheio à própria sorte, sem qualquer tipo de preocupação com o mais adiante, sem qualquer tipo de preocupação com o segundo seguinte (bom é ser árvore, vento: ser, apenas: altamente), sem qualquer tipo de preocupação com o minuto que atravessa estas linhas quando escrevo.
(meu tempo é quando.)
permanecer uno & sempre só & alheio à própria sorte, com o mesmo rosto tranqüilo, sereno, diante da vida ou da morte.
o rosto tranqüilo, sereno, diante da vida (assustadora por suas artimanhas & reviravoltas) ou diante da morte (assustadora por representar o fim & o desconhecido, viagem de onde não mais se retorna): a grandeza inconsciente de não pensar & de, não pensando, não temer: ser, apenas: altamente.
apenas “ser”: viver no mais cristalino, no mais puro presente: permanecer uno, alheio à própria sorte, sem qualquer tipo de preocupação com o mais adiante, sem qualquer tipo de preocupação com o segundo seguinte, sem qualquer tipo de preocupação com o minuto que atravessa estas linhas quando escrevo.
apenas “ser”: viver no mais cristalino, no mais puro presente:
o presente:
para mim, este rumor alado de primavera: pássaros a riscar o céu azul da estação que representa o eterno renascer, a presente renovação das coisas & do mundo.
dia claro, céu limpo de nuvens: o vinho da claridade, vinho doce, nada rascante, servido em copos de mais azul.
vida: dia claro céu azul: tua lúcida presença.
vida: viva acesa intransponível: este rumor alado de primavera.
enquanto a terra, que não sabe este instante (em sua grandeza inconsciente, assim como a árvore, o vento), enquanto a terra, distante (terra: por mais distante, este errante navegante: quem jamais te esqueceria), enquanto a terra, com toda a sua umidade, com todo o seu frescor primaveril, terra onde se renasce, onde se revive, segura & sem pressa (apoiada — a terra — na firmeza própria da sua matéria), a terra espera, a terra aguarda, espera por nosso encontro, encontro nosso que ocorrerá a qualquer instante, num instante qualquer.
(terra: o meu rosto, no futuro, sendo aquele de todos os teus mortos, mais um rosto passado, anônimo, desconhecido: rosto nenhum.)
o meu epigrama: desembrulhar eternamente o presente que me chega nas mãos, enquanto a terra, distante, com toda a sua umidade, segura & sem pressa, espera (por mim).
beijo todos!
paulo sabino.
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(do livro: Antologia poética. autora: Marly de Oliveira. organização: João Cabral de Melo Neto. editora: Nova Fronteira.)
EPIGRAMA
Bom é ser árvore, vento,
sua grandeza inconsciente;
e não pensar, não temer,
ser, apenas: altamente.
Permanecer uno e sempre
só e alheio à própria sorte,
com o mesmo rosto tranqüilo
diante da vida ou da morte.
PRESENTE
Para mim, este rumor
alado de primavera.
O vinho da claridade
em copos de mais azul.
Tua lúcida presença.
Enquanto, distante, a terra,
com toda a sua umidade,
segura e sem pressa, espera.
Ah….Agora sim encontrei o lugar dos comentários. heheeh! Bem já deixei lá as minhas palavras de extrema admiração, mas as coloco aqui . Maravilhoso, nunca vi nada igual querido poeta. Que qualidade teus poemas ! Amei!
Maravilha, Marisete!
Bom saber que você gostou dos poemas! A Marly de Oliveira é uma das nossas maiores. Sua obra poética é magia pura.
Beijo grande!